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Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, 14/05/2024

14 de Maio de 2024

A Palavra de Deus na Bíblia (86): Interpretação e tradução da Bíblia

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14 de Maio de 2024

A Palavra de Deus na Bíblia (86): Interpretação e tradução da Bíblia

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10/03/2017 14:50 - Atualizado em 10/03/2017 14:51

A Palavra de Deus na Bíblia (86): Interpretação e tradução da Bíblia 0

10/03/2017 14:50 - Atualizado em 10/03/2017 14:51

Neste artigo prosseguimos na busca da melhor compreensão do fenômeno da “inculturação” dentro do universo da exegese e da tradução bíblicas. Sabemos dos desafios desta empresa, mas é inevitável realizá-la, quando sabemos que o Evangelho tem sua pátria no coração e na alma de cada cultura em que se encontra.

Escrito em grego, o Novo Testamento é inteiramente marcado por um dinamismo de inculturação, pois ele transpõe na cultura judeo-helenística a mensagem palestina de Jesus, manifestando desta maneira uma clara vontade de ultrapassar os limites de um ambiente cultural único1.

Eis a dinâmica da tradução bíblica: compor no texto, de uma língua a outra, o encontro de duas culturas, mesmo diversas e irredutíveis, abertas à construção de uma nova identidade: o texto traduzido e acolhido na sua nova residência, isto é, da Palestina de Jesus ao mundo helenizado da Igreja Antiga, na Ásia Menor2 daquele tempo!

Etapa fundamental, a tradução dos textos bíblicos não pode, no entanto, ser suficiente a assegurar uma verdadeira inculturação. Esta deve continuar graças a uma interpretação que coloque a mensagem bíblica em relação mais explícita com as maneiras de sentir, de pensar, de viver e de se exprimir próprias à cultura local3.

A tradução bíblica, no entanto, por não ser mera transcrição de códigos linguísticos, exprimirá o esforço da comunidade eclesial em inserir-se adequadamente no centro de uma nova cultura, com sua língua, mentalidade, religiosidade..., um esforço imenso de respeito, mas também de ousadia confiante, em manter-se fiel à originalidade do Evangelho encarnado e assumido na “carne” de cada cultura dos destinatários da graça da verdade. A coragem dos evangelizadores ao usar tais ferramentas, funda-se na certeza de que não haja cultura incapaz de receber no universo de suas categorias fundamentais a mensagem do Criador e Redentor dos homens.

Da interpretação passa-se, em seguida, a outras etapas da inculturação que terminam na formação de uma cultura local cristã, estendendo-se a todas as dimensões da existência (oração, trabalho, vida social, costumes, legislação, ciências e artes, reflexão filosófica e teológica). A Palavra de Deus é, efetivamente, uma semente que tira da terra, onde ela se encontra, os elementos úteis ao seu crescimento e à sua fecundidade (cfr. Ad Gentes, 22)4.

Sem dúvida, o processo de inculturação, por ser uma operação complexa e humana, isto quer dizer, com falhas, rejeições e insucessos, exige todo o cuidado, tempo, e o escalonamento em etapas. Um processo histórico de “relacionamento” entre culturas é que demonstrará a ocasião e as operações que se devem realizar, passo a passo, para que o Evangelho, de fato seja inculturado em novos universos.

Consequentemente, os cristãos devem procurar discernir “quais riquezas Deus, em sua generosidade, dispensou às nações; eles devem ao mesmo tempo fazer um esforço para iluminar essas riquezas com a luz evangélica, de libertá-las, de trazê-las sob a autoridade do Deus Salvador” (Ad Gentes, 11)5.

Não se deve esquecer que inexiste processo de inculturação duradouro e bem sucedido sem a interferência de vidas humanas, que sejam, concretamente, a melhor tradução da beleza, do encanto e da verdade trazidos pelo anúncio do Evangelho. Mais do que operações literárias, a comunicação intercultural da fé precisa e se apoia em “testemunhas”. Os santos, amigos e discípulos Daquele que difundem pela Palavra e pela vida.

Os atos dos apóstolos exprimem com muita veemência que apesar das dificuldades em relação aos judeus, aquela comunidade pelo afeto fraterno, pela partilha de bens, pela vida de oração e do ensino apostólico (a doutrina) era a mais a convincente mediação da Palavra de Deus, de Cristo Ressuscitado no mundo de judeus e de helênicos6.

Não se trata, pode-se ver, de um processo com sentido único, mas de uma “mútua fecundação”. De um lado as riquezas contidas nas diversas culturas permitem à Palavra de Deus de produzir novos frutos e, de outro lado, a luz da Palavra de Deus permite de fazer uma triagem naquilo que trazem as culturas, para rejeitar os elementos nocivos e favorecer o desenvolvimento dos elementos válidos. A total fidelidade à pessoa do Cristo, ao dinamismo de seu mistério pascal e a seu amor pela Igreja faz evitar duas soluções falsas: aquela da “adaptação” superficial da mensagem e aquela da confusão sincretista (cf Ad Gentes, 22) 7.

Referências:

1 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

2 http://escola.britannica.com.br/article/480681/Asia-Menor: ‘A Ásia Menor é uma região em que os continentes da Ásia e da Europa ficam próximos um do outro, separados apenas por uma faixa estreita de mar. É também conhecida por seu nome grego, Anatólia. No passado, era ponto de encontro de viajantes que passavam entre a Ásia e a Europa. Hoje, é parte da Turquia. A Ásia Menor é uma península, isto é, um pedaço de terra cercado de água por todos os lados menos um, que é ligado ao continente. A palavra “península” significa “quase ilha”. O mar Negro fica ao norte da Ásia Menor; o mar Egeu, a oeste; e o Mediterrâneo, ao sul. A península se estende no sentido leste-oeste da Ásia em direção à Europa’.

3 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

4 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

5 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

6 At 2, 44-47: ‘44. Todos os fiéis viviam unidos e tinham tudo em comum. 45. Vendiam as suas propriedades e os seus bens, e dividiam-nos por todos, segundo a necessidade de cada um. 46. Unidos de coração frequentavam todos os dias o templo. Partiam o pão nas casas e tomavam a comida com alegria e singeleza de coração, 47. louvando a Deus e cativando a simpatia de todo o povo. E o Senhor cada dia lhes ajuntava outros que estavam a caminho da salvação’.

7 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

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A Palavra de Deus na Bíblia (86): Interpretação e tradução da Bíblia

10/03/2017 14:50 - Atualizado em 10/03/2017 14:51

Neste artigo prosseguimos na busca da melhor compreensão do fenômeno da “inculturação” dentro do universo da exegese e da tradução bíblicas. Sabemos dos desafios desta empresa, mas é inevitável realizá-la, quando sabemos que o Evangelho tem sua pátria no coração e na alma de cada cultura em que se encontra.

Escrito em grego, o Novo Testamento é inteiramente marcado por um dinamismo de inculturação, pois ele transpõe na cultura judeo-helenística a mensagem palestina de Jesus, manifestando desta maneira uma clara vontade de ultrapassar os limites de um ambiente cultural único1.

Eis a dinâmica da tradução bíblica: compor no texto, de uma língua a outra, o encontro de duas culturas, mesmo diversas e irredutíveis, abertas à construção de uma nova identidade: o texto traduzido e acolhido na sua nova residência, isto é, da Palestina de Jesus ao mundo helenizado da Igreja Antiga, na Ásia Menor2 daquele tempo!

Etapa fundamental, a tradução dos textos bíblicos não pode, no entanto, ser suficiente a assegurar uma verdadeira inculturação. Esta deve continuar graças a uma interpretação que coloque a mensagem bíblica em relação mais explícita com as maneiras de sentir, de pensar, de viver e de se exprimir próprias à cultura local3.

A tradução bíblica, no entanto, por não ser mera transcrição de códigos linguísticos, exprimirá o esforço da comunidade eclesial em inserir-se adequadamente no centro de uma nova cultura, com sua língua, mentalidade, religiosidade..., um esforço imenso de respeito, mas também de ousadia confiante, em manter-se fiel à originalidade do Evangelho encarnado e assumido na “carne” de cada cultura dos destinatários da graça da verdade. A coragem dos evangelizadores ao usar tais ferramentas, funda-se na certeza de que não haja cultura incapaz de receber no universo de suas categorias fundamentais a mensagem do Criador e Redentor dos homens.

Da interpretação passa-se, em seguida, a outras etapas da inculturação que terminam na formação de uma cultura local cristã, estendendo-se a todas as dimensões da existência (oração, trabalho, vida social, costumes, legislação, ciências e artes, reflexão filosófica e teológica). A Palavra de Deus é, efetivamente, uma semente que tira da terra, onde ela se encontra, os elementos úteis ao seu crescimento e à sua fecundidade (cfr. Ad Gentes, 22)4.

Sem dúvida, o processo de inculturação, por ser uma operação complexa e humana, isto quer dizer, com falhas, rejeições e insucessos, exige todo o cuidado, tempo, e o escalonamento em etapas. Um processo histórico de “relacionamento” entre culturas é que demonstrará a ocasião e as operações que se devem realizar, passo a passo, para que o Evangelho, de fato seja inculturado em novos universos.

Consequentemente, os cristãos devem procurar discernir “quais riquezas Deus, em sua generosidade, dispensou às nações; eles devem ao mesmo tempo fazer um esforço para iluminar essas riquezas com a luz evangélica, de libertá-las, de trazê-las sob a autoridade do Deus Salvador” (Ad Gentes, 11)5.

Não se deve esquecer que inexiste processo de inculturação duradouro e bem sucedido sem a interferência de vidas humanas, que sejam, concretamente, a melhor tradução da beleza, do encanto e da verdade trazidos pelo anúncio do Evangelho. Mais do que operações literárias, a comunicação intercultural da fé precisa e se apoia em “testemunhas”. Os santos, amigos e discípulos Daquele que difundem pela Palavra e pela vida.

Os atos dos apóstolos exprimem com muita veemência que apesar das dificuldades em relação aos judeus, aquela comunidade pelo afeto fraterno, pela partilha de bens, pela vida de oração e do ensino apostólico (a doutrina) era a mais a convincente mediação da Palavra de Deus, de Cristo Ressuscitado no mundo de judeus e de helênicos6.

Não se trata, pode-se ver, de um processo com sentido único, mas de uma “mútua fecundação”. De um lado as riquezas contidas nas diversas culturas permitem à Palavra de Deus de produzir novos frutos e, de outro lado, a luz da Palavra de Deus permite de fazer uma triagem naquilo que trazem as culturas, para rejeitar os elementos nocivos e favorecer o desenvolvimento dos elementos válidos. A total fidelidade à pessoa do Cristo, ao dinamismo de seu mistério pascal e a seu amor pela Igreja faz evitar duas soluções falsas: aquela da “adaptação” superficial da mensagem e aquela da confusão sincretista (cf Ad Gentes, 22) 7.

Referências:

1 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

2 http://escola.britannica.com.br/article/480681/Asia-Menor: ‘A Ásia Menor é uma região em que os continentes da Ásia e da Europa ficam próximos um do outro, separados apenas por uma faixa estreita de mar. É também conhecida por seu nome grego, Anatólia. No passado, era ponto de encontro de viajantes que passavam entre a Ásia e a Europa. Hoje, é parte da Turquia. A Ásia Menor é uma península, isto é, um pedaço de terra cercado de água por todos os lados menos um, que é ligado ao continente. A palavra “península” significa “quase ilha”. O mar Negro fica ao norte da Ásia Menor; o mar Egeu, a oeste; e o Mediterrâneo, ao sul. A península se estende no sentido leste-oeste da Ásia em direção à Europa’.

3 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

4 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

5 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

6 At 2, 44-47: ‘44. Todos os fiéis viviam unidos e tinham tudo em comum. 45. Vendiam as suas propriedades e os seus bens, e dividiam-nos por todos, segundo a necessidade de cada um. 46. Unidos de coração frequentavam todos os dias o templo. Partiam o pão nas casas e tomavam a comida com alegria e singeleza de coração, 47. louvando a Deus e cativando a simpatia de todo o povo. E o Senhor cada dia lhes ajuntava outros que estavam a caminho da salvação’.

7 http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_

Padre Pedro Paulo Alves dos Santos
Autor

Padre Pedro Paulo Alves dos Santos

Doutor em Teologia Bíblica