14 de Maio de 2024
A Palavra de Deus na Bíblia (84): Interpretação e tradução da Bíblia
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24/02/2017 00:00
A Palavra de Deus na Bíblia (84): Interpretação e tradução da Bíblia 0
24/02/2017 00:00
Neste artigo, avançamos na perspectiva dos desafios trazido pela tarefa eclesial, aquela de interpretar as Sagradas Escrituras, no contexto da tradição judaico-helenista na Antiguidade, e de outro, do contexto moderno e desafiador da ciência e da tecnologia, que tanto modificou a mentalidade social acerca da religião. Em outras palavras, trata-se de atualizar autenticamente o significado do Texto Sagrado, tornando-o ainda e sempre, referências para os ouvintes, crentes ou não, em cada tempo.
Retomamos a questão do método, decisão fundamental para que não ocorra falseamento da Palavra de Deus, em nome de buscar novas perspectivas.
A atualização pressupõe uma exegese correta do texto, que determina o sentido literal dele. Se a pessoa que atualiza não tem, ela mesma, uma formação exegética, deve recorrer a bons guias de leitura que permitam de bem orientar a interpretação1.
De início, a Igreja confirma que a tarefa indiscussa da atualização, dada a sua grave responsabilidade, abomina o amadorismo, a iniciativa individual baseada no simples desejo de interpretar a Palavra de Deus, de modo diletante. Mais ainda, com a expressão ‘uma exegese correta do texto’, o documento quer reiterar aquilo que já afirmara anteriormente: dentro do âmbito da exegese bíblica há procedimentos que têm se mostrado ineficazes e até nocivas à descoberta e afirmação do ‘sentido literal’.
Parece, como já vimos, que esta operação de atualização das Escrituras, tem a mesma como mestra. É observando como este processo ocorreu, seja no longo processo de formação do Cânon Véterotestamentários, seja nas relações entre o Antigo e Novo Testamento, nas quais se percebe, claramente, as operações hermenêuticas complexas que advêm, tanto do período de Jesus histórico, quanto da era apostólico, que seguem após a Ressurreição de Jesus.
Para bem conduzir a atualização, a interpretação da Escritura pela Escritura é o método mais seguro e o mais fecundo, especialmente no caso dos textos do Antigo Testamento que foram relidos no próprio Antigo Testamento (por exemplo, o maná de Ex 16 em Sab 16, 20-29) e/ou no Novo Testamento (Jo 6). A atualização de um texto bíblico na existência cristã não pode ser feito corretamente sem se colocar em relação com o mistério do Cristo e da Igreja. Não seria normal, por exemplo, propor a cristãos, como modelos para uma luta de libertação, unicamente episódios do Antigo Testamento (Êxodo; 1-2 Macabeus)2.
Daquilo já afirmado, destaca-se a insistência da Igreja, que o exegeta e intérprete das Escrituras não fujam à ‘analogia fidei’. Que se estabeleça com o Antigo Testamento uma relação de respeito ao seu contexto próprio e às suas dinâmicas etno-culturais semíticas, porém, sem renunciar jamais a ‘colocar em relação com o mistério do Cristo e da Igreja.’
Inspirada nas filosofias hermenêuticas, a operação hermenêutica vem em seguida e comporta três etapas: 1) escutar a Palavra a partir da situação presente; 2) discernir os aspectos da situação presente que o texto bíblico ilumina ou coloca em questão; 3) tirar da plenitude de sentido do texto bíblico os elementos suscetíveis de fazer evoluir a situação presente de uma maneira fecunda, conforme a vontade salvífica de Deus no Cristo.
Neste parágrafo, à guisa de síntese, a Igreja recorda um princípio fundamental exposto pela necessidade da interpretação e do manuseio correto da exegese bíblica: o uso da razão nas relações com a Fé.
Quando se nota o crescimento de ambientes ‘fundamentalistas’ na esfera do Cristianismo, em particular na América Latina, deparamo-nos com a renúncia da razão e da ciência no estabelecimento do sentido da Palavra de Deus, o que exprime um contexto de adoecimento da religião, colocando em risco sua identidade.
Tudo por causa da necessidade de utilizar, como nas ‘filosofias hermenêuticas’, ingredientes racionais na verificação e atualização do sentido literal das Escrituras.
Além disso, a Comissão Bíblica aponta as etapas de elaboração de um percurso hermenêutico das Escrituras a ser palmilhado pelos estudiosos:
1) ‘escutar a Palavra a partir da situação presente’
Não se pode interpretar bem uma Palavra que não permitimos que se dirija a nossa inteligência, às nossas expectativas e anseios. O primeiro apelo de Deus a Israel, que se converteu em mandamento, após o pecado original: “Ouve Israel, o Senhor teu Deus!” (Dt 6,4s)3. Sem esta escuta que estabelece uma sadia relação com Deus, não se confronta de modo justo e proveitoso a Palavra de Deus. Neste mesmo universo, a eterna Palavra de Deus entra em contato conosco através de nossas coordenadas, de tempo e espaço. Por isso, as circunstâncias de quem lê e ouve as Escrituras não são opcionais a quem se propõe atualizar o texto bíblico.
2) ‘discernir os aspectos da situação presente que o texto bíblico ilumina ou coloca em questão’
Afinal de contas, tanto o exegeta quanto o teólogo que realizam operações hermenêuticas sobre textos bíblicos, não o fazem no vácuo, numa redoma atemporal, eles trazem perguntas aos Textos, que não foram realizadas no passado e que exigem nova linguagem e significações. Animados pela razão laboriosa e pelas inspirações do ‘Espirito da Verdade’, estes têm suas próprias inquietações e a de seus contemporâneos como contexto da interpretação.
Mas, a Santa Sé não diz somente isso. Afirma, sobretudo, que será a Palavra de Deus a julgar e ‘iluminar’ a realidade, da qual se interpela os textos. Não é o ‘mundo presente’ (linguagem comum em São Paulo, por exemplo) que dita as regras, mas este é ‘julgado’ pelo escrutínio da Vontade Divina, expressa na sua Revelação.
3) ‘tirar da plenitude de sentido do texto bíblico os elementos suscetíveis de fazer evoluir a situação presente de uma maneira fecunda, conforme a vontade salvífica de Deus no Cristo’
Cabe à exegese autêntica de textos bíblicos ‘extrair’ o Sentido Pleno (aquilo que Deus quer comunicar!), para que se aplique à realidade a Vontade de Deus, expressa em sua Palavra, e não uma ideologia religiosa. No centro da questão está a permanência no único princípio hermenêutico válido: Cristo é o Senhor! Não se trata de buscar ‘novidades’, mas de renovar o mundo presente pela Palavra de Deus, viva e atual.
Referências:
1http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_po.html#IV
2http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_po.html#IV
3‘Ouve, ó Israel! O Senhor, nosso Deus, é o único Senhor. 5 Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todas as tuas forças’.
A Palavra de Deus na Bíblia (84): Interpretação e tradução da Bíblia
24/02/2017 00:00
Neste artigo, avançamos na perspectiva dos desafios trazido pela tarefa eclesial, aquela de interpretar as Sagradas Escrituras, no contexto da tradição judaico-helenista na Antiguidade, e de outro, do contexto moderno e desafiador da ciência e da tecnologia, que tanto modificou a mentalidade social acerca da religião. Em outras palavras, trata-se de atualizar autenticamente o significado do Texto Sagrado, tornando-o ainda e sempre, referências para os ouvintes, crentes ou não, em cada tempo.
Retomamos a questão do método, decisão fundamental para que não ocorra falseamento da Palavra de Deus, em nome de buscar novas perspectivas.
A atualização pressupõe uma exegese correta do texto, que determina o sentido literal dele. Se a pessoa que atualiza não tem, ela mesma, uma formação exegética, deve recorrer a bons guias de leitura que permitam de bem orientar a interpretação1.
De início, a Igreja confirma que a tarefa indiscussa da atualização, dada a sua grave responsabilidade, abomina o amadorismo, a iniciativa individual baseada no simples desejo de interpretar a Palavra de Deus, de modo diletante. Mais ainda, com a expressão ‘uma exegese correta do texto’, o documento quer reiterar aquilo que já afirmara anteriormente: dentro do âmbito da exegese bíblica há procedimentos que têm se mostrado ineficazes e até nocivas à descoberta e afirmação do ‘sentido literal’.
Parece, como já vimos, que esta operação de atualização das Escrituras, tem a mesma como mestra. É observando como este processo ocorreu, seja no longo processo de formação do Cânon Véterotestamentários, seja nas relações entre o Antigo e Novo Testamento, nas quais se percebe, claramente, as operações hermenêuticas complexas que advêm, tanto do período de Jesus histórico, quanto da era apostólico, que seguem após a Ressurreição de Jesus.
Para bem conduzir a atualização, a interpretação da Escritura pela Escritura é o método mais seguro e o mais fecundo, especialmente no caso dos textos do Antigo Testamento que foram relidos no próprio Antigo Testamento (por exemplo, o maná de Ex 16 em Sab 16, 20-29) e/ou no Novo Testamento (Jo 6). A atualização de um texto bíblico na existência cristã não pode ser feito corretamente sem se colocar em relação com o mistério do Cristo e da Igreja. Não seria normal, por exemplo, propor a cristãos, como modelos para uma luta de libertação, unicamente episódios do Antigo Testamento (Êxodo; 1-2 Macabeus)2.
Daquilo já afirmado, destaca-se a insistência da Igreja, que o exegeta e intérprete das Escrituras não fujam à ‘analogia fidei’. Que se estabeleça com o Antigo Testamento uma relação de respeito ao seu contexto próprio e às suas dinâmicas etno-culturais semíticas, porém, sem renunciar jamais a ‘colocar em relação com o mistério do Cristo e da Igreja.’
Inspirada nas filosofias hermenêuticas, a operação hermenêutica vem em seguida e comporta três etapas: 1) escutar a Palavra a partir da situação presente; 2) discernir os aspectos da situação presente que o texto bíblico ilumina ou coloca em questão; 3) tirar da plenitude de sentido do texto bíblico os elementos suscetíveis de fazer evoluir a situação presente de uma maneira fecunda, conforme a vontade salvífica de Deus no Cristo.
Neste parágrafo, à guisa de síntese, a Igreja recorda um princípio fundamental exposto pela necessidade da interpretação e do manuseio correto da exegese bíblica: o uso da razão nas relações com a Fé.
Quando se nota o crescimento de ambientes ‘fundamentalistas’ na esfera do Cristianismo, em particular na América Latina, deparamo-nos com a renúncia da razão e da ciência no estabelecimento do sentido da Palavra de Deus, o que exprime um contexto de adoecimento da religião, colocando em risco sua identidade.
Tudo por causa da necessidade de utilizar, como nas ‘filosofias hermenêuticas’, ingredientes racionais na verificação e atualização do sentido literal das Escrituras.
Além disso, a Comissão Bíblica aponta as etapas de elaboração de um percurso hermenêutico das Escrituras a ser palmilhado pelos estudiosos:
1) ‘escutar a Palavra a partir da situação presente’
Não se pode interpretar bem uma Palavra que não permitimos que se dirija a nossa inteligência, às nossas expectativas e anseios. O primeiro apelo de Deus a Israel, que se converteu em mandamento, após o pecado original: “Ouve Israel, o Senhor teu Deus!” (Dt 6,4s)3. Sem esta escuta que estabelece uma sadia relação com Deus, não se confronta de modo justo e proveitoso a Palavra de Deus. Neste mesmo universo, a eterna Palavra de Deus entra em contato conosco através de nossas coordenadas, de tempo e espaço. Por isso, as circunstâncias de quem lê e ouve as Escrituras não são opcionais a quem se propõe atualizar o texto bíblico.
2) ‘discernir os aspectos da situação presente que o texto bíblico ilumina ou coloca em questão’
Afinal de contas, tanto o exegeta quanto o teólogo que realizam operações hermenêuticas sobre textos bíblicos, não o fazem no vácuo, numa redoma atemporal, eles trazem perguntas aos Textos, que não foram realizadas no passado e que exigem nova linguagem e significações. Animados pela razão laboriosa e pelas inspirações do ‘Espirito da Verdade’, estes têm suas próprias inquietações e a de seus contemporâneos como contexto da interpretação.
Mas, a Santa Sé não diz somente isso. Afirma, sobretudo, que será a Palavra de Deus a julgar e ‘iluminar’ a realidade, da qual se interpela os textos. Não é o ‘mundo presente’ (linguagem comum em São Paulo, por exemplo) que dita as regras, mas este é ‘julgado’ pelo escrutínio da Vontade Divina, expressa na sua Revelação.
3) ‘tirar da plenitude de sentido do texto bíblico os elementos suscetíveis de fazer evoluir a situação presente de uma maneira fecunda, conforme a vontade salvífica de Deus no Cristo’
Cabe à exegese autêntica de textos bíblicos ‘extrair’ o Sentido Pleno (aquilo que Deus quer comunicar!), para que se aplique à realidade a Vontade de Deus, expressa em sua Palavra, e não uma ideologia religiosa. No centro da questão está a permanência no único princípio hermenêutico válido: Cristo é o Senhor! Não se trata de buscar ‘novidades’, mas de renovar o mundo presente pela Palavra de Deus, viva e atual.
Referências:
1http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_po.html#IV
2http://www.vatican.va/roman_curia/congregations/cfaith/pcb_documents/rc_con_cfaith_doc_19930415_interpretazione_po.html#IV
3‘Ouve, ó Israel! O Senhor, nosso Deus, é o único Senhor. 5 Amarás o Senhor, teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma e de todas as tuas forças’.
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