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Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, 04/05/2024

04 de Maio de 2024

Orígenes e Agostinho: o nome de Jesus em toda a terra

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Orígenes e Agostinho: o nome de Jesus em toda a terra

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27/08/2021 00:00
Por: Carlos Moioli

Orígenes e Agostinho: o nome de Jesus em toda a terra 0

Iahweh dá a salvação! Este é o sentido do nome ‘Jesus’, transcrição grega do hebraico Yoshua, que também se transcreve como Josué, de modo que Jesus e Josué são originalmente o mesmo nome. Por isso, quando Josué é escolhido por Moisés para liderar seu povo na entrada da terra prometida, conforme o relato do livro homônimo, vê-se aí a figura de Jesus, o salvador: “Assim, aprendemos o nome Jesus por primeira vez quando o vemos como o líder do exército; não como a quem Moisés impõe sua ordem, mas aquele a quem Moisés concedeu primazia. Moisés não foi capaz de escolher homens fortes. ‘Escolhe’, diz ele, para ti homens fortes dentre os filhos de Israel’. Portanto, na primeira vez que me familiarizo com o nome Jesus, descubro imediatamente o símbolo de um mistério. Na verdade, Jesus lidera o exército”. Esta é uma passagem da primeira homilia de Orígenes sobre o livro de Josué (Origène, Homélies sur Josué. Texte latin,introduction et notes deAnnie Jaubert. Sources Chrétiennes. Paris: Éd.du Cerf, 1960, p. 97, tradução do autor).

As homilias de Orígenes sobre o complexo livro de Josué são de alta relevância teológica e litúrgica: teológica porque, diferentemente do que se pensa com frequência, a homília é expressão condensada de um pensamento teológico próprio, como no caso de Orígenes; litúrgica, porque se insere no rito e tem, por conseguinte, uma natureza mistagógica, isto é, de elevação do fiel a Deus pela força do próprio Espírito Santo que age no rito. Num total de 26 homilias, a obra de Orígenes sobre Josué termina no Capítulo 22 do livro do patriarca bíblico, que consta de 24 capítulos. Isto não nos impede de refletir sobre o Capítulo 24 do livro de Josué, se usarmos as importantes meditações das homilias anteriores e uma ou outra obra do próprio Orígenes que completam sua exegese. Além disso, recorreremos também a Agostinho, que, influenciado por Orígenes, também nos instrui a respeito da passagem que hoje nos interessa.

Contudo, há uma controvérsia com a aproximação de Josué a Jesus Cristo, dado que o primeiro é um líder guerreiro, que não poupou os povos estrangeiros da espada e do fogo. Orígenes e Agostinho, ao interpretarem tipologicamente o livro de Josué, fazem-no a partir de uma exegese espiritual, em que o combate armado de Josué se torna figura das lutas espirituais da Igreja e de cada fiel. Eis o que nos dias Orígenes em sua segunda homilia sobre o livro de Josué: “Quais são os lugares para os quais subimos com as solas dos nossos pés? A letra da Lei, deita-se à terra, jaz no chão. Portanto, quem segue a letra da Lei nunca ascende. Mas, se tiveres sucesso para te elevares ao espírito e se te elevares do sentido literal para uma inteligência superior, então verdadeiramente ascendeste àquele lugar sublime e excelso que receberás de Deus em herança. Com efeito, se entendes que nas Escrituras que existem tipos, percebes que há figuras de realidade celeste; e se, com o espírito e a inteligência buscas as coisas de cima, ‘onde Cristo está sentado à destra de Deus’, Cl 3, 1, então também receberás aquele lugar como uma herança, porque o nosso Senhor e Salvador diz: ‘Onde eu estiver, haverá o meu também servo’, Jo 12, 26. Então, se chegares a Cristo sentado à destra de Deus, pela fé, vida, pureza e virtude; se entrares naquele lugar com as plantas do pés lavados por Jesus, cf. Jo 13,5, Deus te dará o prometido; então te tornarás não apenas herdeiro, mas também coerdeiro de Cristo, Rm 8, 17. (Orígenes, ‘Homilias sobre Josué’ 2, 3).

Assim como Agostinho, conhecemos a tradução latina feita por Rufino das homilias de Orígenes. As ‘Homilias sobre o livro de Josué’ foram publicadas em sua edição crítica pela coleção ‘Sources Chrétiennes’, a qual seguimos aqui. A longa introdução de Annie Jaubert também é credora deste artigo. Seguimos igualmente outras obras de Orígenes pela edição italiana: ‘La Bibbia Commentata dai Padri Antico Testamento3, Giosuè...’ John R. Franke, Chiara Spuntarelli. Roma: Città Nuova, 2007.

Outro elemento importante do Capítulo 24 do livro de Josué é explorado por Santo Agostinho. Trata-se da expressão ‘toda a terra’. Vejamos como Agostinho interpreta esta passagem, com escolhas uma vez mais tipológicas: “O que a tradução dos Setenta expressa nos seguintes termos: ‘tomei o vosso pai Abraão do outro lado do rio e o levei a toda a terra’, a tradução do hebraico expressa assim: ‘eo levei a toda a terra de Canaã’. Parece estranho que os Setenta quisessem apontar toda a terra em vez de apenas a terra de Canaã, a menos que tivessem uma profecia em seu espírito, para que se entendesse como um fato ocorrido pela promessa de Deus para prenunciar com certeza o que haveria de ocorrer a respeito de Cristo e da Igreja, que é a verdadeira descendência de Abraão, não formada já pelos filhos da carne, mas pelos filhos dapromessa, cf. Rm 9, 8” (Agostinho, ‘Perguntas sobre o Heptateuco’ 6, 25). Então, esta tipologia da Igreja como terra prometida universal é fundamental na Patrística e ela insiste na analogia do caminho da história da salvação percorrido pelo povo antigo, de modo que o tema da fidelidade à aliança com Deus é o sustentáculo da unidade do povo escolhido.

‘Escolhei hoje a quem servir’, exorta Josué a seu povo (24, 15). Esta exortação é, para Orígenes, um chamado à fidelidade a Jesus Cristo e a seu batismo num serviço exclusivo ao Senhor: “O que Josué disse ao povo quando o introduziu na terra prometida, a Escritura nos poderia dizer também a nós agora. A passagem diz: ‘Agora temei ao Senhor e servi-o com retidão e justiça’. Para nós, que somos estimulados a adorar ídolos, acrescentam-se estas palavras: ‘Removei as divindades estrangeiras, que vossospais serviram do outro lado do rio e no Egito, e servi ao Senhor’. No início, quando devíeis ser catequizados, podíeis dizer com razão: ‘Se não vos agrada servir ao Senhor, escolhei hoje a quem vais servir: se aos deuses que vossos pais serviram além do rio ou aodeuses dos amorreus, em cuja terra ireis viver’. E aquele que vos instruía dissera: ‘Minha casa e eu serviremos ao Senhor, porque Ele é santo’. Agora não é maishora de vos falar assim., de modo que respondestes assim: ‘Longe de nós abandonar o Senhor para servir a outros deuses! O Senhor, nosso Deus, é Deus, que  nos fez sair, nós e nossos pais do Egito, e nos guardou durante todo o caminho que percorremos’. Além disso, nos compromissos solenes de piedade, vós haveis respondido isto para aqueles que vos instruíam: ‘Nós serviremos ao Senhor, porque ele é nosso Deus’, Js 24, 18. Se, portanto, aquele que viola os pactos estipulados entre os homens é considerado infiel e longe da salvação,o que dizer daqueles que, por terem renegado a fé, violam as promessas feitas a Deus [no batismo] e, assim, voltam a Satanás, a quem, ao serem batizados, eles renunciaram? Na verdade, devem ser repetidas aqui as palavras dirigidas por Eliaos filhos: ‘Se um homem pecar contra outro homem, pede-se a Deus por ele; mas se alguém peca contra o Senhor quem intercederá por Ele?’, 1 Sam. 2, 25” (Orígenes,‘Exortação ao martírio’ 17).

            Enfim, Josué, figura de Jesus que luta, combate e sofre pela sua Igreja. Ao mesmo tempo, a Igreja, terra prometida, recebe todos os homens, ou melhor, a terra prometida é toda a terra, conforme a interpretação de Agostinho. E a própria Igreja confessa hoje, com Simão Pedro, a fé em Jesus: ‘Nós cremos firmemente e reconhecemos que tu és o Santo de Deus’.  

Carlos Frederico Calvet da Silveira, professor da Universidade Católica de Petrópolis e do Seminário de São José, Rio



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