Arquidiocese do Rio de Janeiro

34º 22º

Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, 17/05/2024

17 de Maio de 2024

Igreja, povo de Deus

Enviando...
Por favor, preencha os campos adequadamente.
Ocorreu um erro no envio do e-mail.
E-mail enviado com sucesso.

17 de Maio de 2024

Igreja, povo de Deus

Se você encontrou erro neste texto ou nesta página, por favor preencha os campos abaixo. O link da página será enviado automaticamente a ArqRio.

Enviando...
Por favor, preencha os campos adequadamente.
Ocorreu um erro no envio do erro.
Erro relatado com sucesso, obrigado.

03/10/2014 10:13 - Atualizado em 03/10/2014 10:14

Igreja, povo de Deus 0

03/10/2014 10:13 - Atualizado em 03/10/2014 10:14

“A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isto vem do Senhor, e é maravilha aos nossos olhos.”

Reunimo-nos hoje na Casa de Deus com o coração cheio de gratidão. Este é o sentimento que deve brotar em nosso coração cada vez que aqui nos reunimos, como Igreja do Senhor, para celebrarmos a Eucaristia: a gratidão. Somos infinitamente gratos a Deus, nosso Pai, que preparou para nós este dia – o Domingo – e que preparou para nós este lugar – sua Casa e nossa Casa, a Casa da Igreja – onde nos reunimos para celebrar o Cristo, nossa Páscoa, nossa Solenidade Semanal, causa da nossa alegria e júbilo, nosso Salvador e Redentor.

Antes de penetrarmos no conteúdo profundo da Palavra de Deus que acabamos de ouvir, gostaria de chamar a atenção, para as orações que compõem a moldura dessa celebração e que nos revelam o sentido profundo do que estamos realizando agora. Poderíamos nos antecipar agora e voltar o nosso olhar para a oração que daqui a pouco vamos fazer sobre as oferendas. Ela nos diz: “Acolhei, ó Deus, nós vos pedimos, o sacrifício que instituístes e, pelos mistérios que celebramos em vossa honra, completai a santificação dos que salvastes”. Deus, nosso Pai, instituiu para nós este mistério que celebramos, a Páscoa do seu Filho, seu sacrifício tornado presente para nós em toda a sua força no altar. E nós, todas as vezes que celebramos estes mistérios em honra do Pai, somos santificados.

O Cristo já ofereceu uma única vez o seu sacrifício para nossa salvação, mas nós, à medida que celebramos os divinos mistérios, à medida em que participamos deste sacrifício, deste culto de louvor ao Pai, por Cristo, no Espírito Santo, somos santificados, somos penetrados pela salvação que Cristo nos alcançou no alto da sua cruz.

É belíssima e, também, profunda, a oração pós-comunhão, que diz: “Possamos, ó Deus onipotente, saciar-nos do pão celeste e inebriar-nos do vinho sagrado, para que sejamos transformados naquele que agora recebemos”. Nós comungamos, meus irmãos, não pão comum nem vinho simplesmente. Nós somos saciados pelo “pão celeste” que é o Corpo de Cristo e pelo “vinho sagrado” que é o Sangue de Cristo. E por que recebemos o Corpo e o Sangue de Cristo? Para que sejamos transformados n’Ele.

Enquanto os alimentos comuns que tomamos se transformam em nós, a Eucaristia, alimento celeste, nos transforma n’Ele, no Cristo nosso Senhor e Deus. Nós comungamos a Eucaristia para tornamo-nos uma Eucaristia, ou seja, para que a nossa vida seja como a de Cristo, um sacrifício de ação de graças ao Pai pelo Espírito. Nós comungamos o Cristo para estarmos unidos a Ele e sermos transformados n’Ele; para que o nosso pensar, o nosso agir e o nosso querer sejam o de Nosso Senhor.

Falando em sacrifício de ação de graças, é desse sacrifício do seu Corpo que Cristo nos fala hoje através da parábola dos “vinhateiros homicidas”. Este trecho que hoje ouvimos está na quinta parte do Evangelho de Mateus, onde Jesus começa a falar sobre o Reino dos Céus. Mateus está narrando o ministério de Jesus na Judéia e em Jerusalém. Jesus está no Templo de Jerusalém e conta esta parábola diante dos sumos-sacerdotes, dos mestres da Lei e dos fariseus. Esta parábola tem o mesmo pano de fundo da que ouvimos domingo passado, trata-se da entrega do Reino dos Céus a um povo que realmente produza frutos, uma vez que os israelitas – primeiros, mas não únicos – destinatários da salvação e da promessa do Pai não acolheram o Cristo, o Messias Salvador.

Jesus ilustra aqui a história do povo escolhido com a parábola da vinha e dos vinhateiros. A imagem da vinha para representar o povo de Israel é muito cara ao Antigo Testamento e aparece em vários profetas:

“Mas eu te plantara uma vinha excelente, toda de cepas legítimas. Como te transformastes para mim em ramos degenerados de uma vinha bastarda?”

“A palavra do Senhor foi-me dirigida nestes termos: Filho do homem, a lenha da vinha por que valeria mais que a de galhos das outras árvores da floresta? Toma-se dela para fazer um objeto? Faz-se mesmo uma cavilha para pendurar o que quer que seja? Eis aí: mete-se no fogo para destruir. Quando o fogo consumir as duas extremidades, e queimar o meio, pode ainda servir para alguma coisa? Quando ele estava intacto, não servia para objeto algum; consumido e queimado pelo fogo, ainda menos poderá servir para qualquer coisa. Eis por que diz o Senhor Deus: assim como entre as árvores da floresta é a madeira da vide que eu lanço ao fogo para consumir, assim lançarei eu os habitantes de Jerusalém. Voltarei contra eles a minha face. Fugirão ao fogo; o fogo, porém, os devorará. Saberão que eu sou o Senhor, quando eu voltar contra eles a minha face, e transformar a terra num deserto, porque me têm sido infiéis - oráculo do Senhor Deus.”

Sobretudo, poderíamos destacar a imagem que hoje nos é apresentada pela primeira leitura, este trecho do capítulo 5 de Isaías. Aqui o profeta canta para o “seu amado” o cântico da vinha de um amigo dele. Neste cântico, o amigo do profeta é o próprio Deus e a vinha o povo de Israel. O profeta descreve então todos os cuidados que Deus teve para com o povo escolhido: “Cercou-a, limpou-a de pedras, plantou videiras escolhidas, edificou uma torre no meio e construiu um lagar.” Todavia, a videira produziu uvas selvagens. O povo de Israel depois de ter sido tirado por Deus do Egito, da terra da escravidão, e ter sido plantado na Terra Prometida, terra onde corre leite e mel , deveria produzir bons frutos, mas produziu apenas frutos ruins: a idolatria, a prostituição com os falsos deuses, a confiança maior no poder estrangeiro do que no Deus forte que os havia tirado com mão forte da casa da escravidão. Sendo assim, diz o próprio Deus no final da parábola, a vinha será abandonada à sua própria sorte, será pisoteada, porque Deus vai remover a sua cerca, e secará, porque Deus não lhe mandará mais as chuvas benfazejas.

Tendo por base este trecho do profeta Isaías, Jesus conta, então, a parábola dos vinhateiros homicidas. Jesus vai demonstrar nessa parábola, que essa fúria de Deus pintada pelo profeta Isaías no cântico da vinha, na verdade foi permeada por muita misericórdia, porque Deus, ao longo da história da salvação, embora tenha permitido que o seu povo escolhido sofresse as consequências do pecado indo e vindo dos dois exílios, nunca os abandonou à própria sorte e sempre esperou pacientemente pelos seus frutos, enviando seus servos, os profetas, que tinham como missão recolher algum fruto da videira do Senhor. Diz Jesus nesta parábola, que os vinhateiros além de não entregarem aos servos do dono da vinha os frutos devidos, ainda espancaram e mataram estes. É a imagem clara dos profetas, enviados por Deus ao povo escolhido para ali recolher algum fruto de conversão, mas estes profetas foram perseguidos e mortos.

Por fim, o Pai, numa explosão de misericórdia, enviou o seu próprio Filho, pensado: “Ao meu Filho eles vão respeitar”. Os vinhateiros não somente não deram ouvidos ao Filho, mas confabularam entre si e resolveram matar o Filho fora da vinha a fim de ficarem eles mesmos com a vinha que era de seu patrão. Jesus pergunta então aos sumos-sacerdotes e aos anciãos do povo o que o patrão, o que esse pai deveria fazer com os vinhateiros e estes respondem, dando contra si próprios a sentença de condenação: “Com certeza mandará matar de modo violento esses perversos e arrendará a vinha a outros vinhateiros, que lhe entregarão os frutos no tempo certo.”

Jesus se coloca no centro dessa parábola. Ele é o Filho enviado pelo Pai, como “um saco cheio da sua misericórdia” como diz São Bernardo de Claraval, a fim de que o povo escolhido produza algum fruto. Mas, Jesus vai ser morto fora de Jerusalém. Sua morte, longe de ser o fim, é na verdade, o grande começo, é o centro de tudo, porque pela sua morte nos veio a salvação. “A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isto vem do Senhor, e é maravilha aos nossos olhos.” Com estes versículos do Salmo 118 Jesus explica o mistério da sua morte. Rejeitado pelos construtores e lançado fora, Ele se torna a pedra principal, ou seja, aquela que dá sustentação a todo o edifício e, sem a qual, é impossível que as outras pedras fiquem unidas e firmes.

Morrendo fora de Jerusalém Jesus põe termo aos sacrifícios antigos, porque Ele se fez o nosso sacrifício de expiação. De fato, no dia da Expiação, o Sumo Sacerdote entrava no Santo dos Santos e o aspergia com o sangue das vítimas, mas as vítimas eram queimadas fora do acampamento. Jesus, sendo crucificado e tendo morrido fora do acampamento realiza de maneira definitiva o sacrifício pelos nossos pecados, como nos diz a carta aos Hebreus: “Foi por isso que Jesus, para santificar o povo por seu próprio sangue, sofreu do lado de fora da porta.”

Morrendo para nos salvar Jesus nos manifesta o amor infinito do Pai por nós como nos diz São João: “Pois Deus não enviou o seu Filho ao mundo para julgar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele.” e ainda: “Nisto se manifestou o amor de Deus por nós: Deus enviou o seu Filho único ao mundo para que vivamos por ele. Nisto consiste o amor: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi ele quem nos amou e enviou-nos o seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados.”

Jesus dá desfecho a parábola dizendo que, já que os vinhateiros, ou seja, o povo de Israel e seus guias e mestres, não acolheram o Filho, o Messias enviado pelo Pai, a vinha, ou seja, o Reino de Deus, lhes será tirado e será entregue a um povo que produza frutos: aos pagãos e a todos aqueles que aderirem ao Senhor pela fé, porque como nos diz São Paulo: “De sorte que não há distinção entre judeu e grego, pois ele é Senhor de todos, rico para todos os que o invocam.” e ainda São João: “Quem nele crê não é julgado; quem não crê, já está julgado, porque não creu no Nome do Filho único de Deus.”
Os sumos sacerdotes, os fariseus e os mestres da Lei procuram, a partir de então, matar Jesus, porque eles entenderam que era deles que Jesus estava falando: “Ouvindo estas palavras, os altos funcionários do templo e os fariseus entenderam que ele se referia a eles e procuravam capturá-lo, mas tinham medo da multidão que o considerava um profeta.”

Jesus anuncia aqui o mistério da Igreja, novo povo de Deus, constituído a partir do mistério da sua Páscoa, que recebe a missão de produzir frutos, de ser guardiã dos mistérios do Reino. A este povo qualquer um pode pertencer, desde que preste sua adesão a Cristo por meio da fé, e uma fé que não seja estéril, mas que produza frutos de justiça.

Nós somos esse povo queridos irmãos, povo escolhido de Deus, nascido a partir da morte fecunda do Cristo, nosso Senhor e Deus. Devemos nos cuidar, para que a nossa adesão a Cristo não seja estéril e vazia, para que a nossa fé não seja simplesmente como palavras lançadas ao vento. Devemos produzir frutos de justiça que condigam com a fé que professamos. É a isto que nos exorta hoje o grande Apóstolo dos Gentios, São Paulo, neste trecho belíssimo da carta aos Filipenses que acabamos de ouvir:

“Irmãos: Não vos inquieteis com coisa alguma, mas apresentai as vossas necessidades a Deus, em oração e súplicas, acompanhadas de ação de graças. E a paz de Deus, que ultrapassa todo o entendimento guardará os vossos corações e pensamentos em Cristo Jesus. Quanto ao mais, irmãos, ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, honroso, tudo o que é virtude ou de qualquer modo mereça louvor. Praticai o que aprendestes e recebestes de mim, ou que de mim vistes e ouvistes. Assim o Deus da paz estará convosco.”

Esses são os frutos que Deus espera de nós: nossa oração confiante; uma vida de constante ação de graças a Deus; uma vida preenchida, apesar de nossas fraquezas, com tudo o que diante de Deus mereça louvor. Agradeçamos ao Senhor hoje nesta Eucaristia por sermos este novo povo, esta nova vinha escolhida, plantada e cuidada pelo nosso Deus de amor. Peçamos hoje nesta Eucaristia, a graça de sermos uma vinha que produza frutos para Deus; peçamos que apesar das nossas fraquezas e apesar das uvas selvagens que tantas vezes nascem em nós, auxiliados pelo Espírito Divino, possamos produzir boas uvas para Deus. Peçamos com o salmista: “Voltai-vos para nós, Deus do universo! Olhai dos altos céus e observai. Visitai a vossa vinha e protegei-a! Foi a vossa mão direita que a plantou; protegei-a, e ao rebento que firmastes! E nunca mais vos deixaremos, Senhor Deus! Dai-nos vida, e louvaremos vosso nome! Convertei-nos, ó Senhor Deus do universo, e sobre nós iluminar a vossa face! Se voltardes para nós, seremos salvos!”

27º Domingo do Tempo Comum

05.10.2014
Is 5,1-7
Sl 79 (80)
Fl 4,6-9
Mt 21,33-43

Leia os comentários

Deixe seu comentário

Resposta ao comentário de:

Enviando...
Por favor, preencha os campos adequadamente.
Ocorreu um erro no envio do comentário.
Comentário enviado para aprovação.

Igreja, povo de Deus

03/10/2014 10:13 - Atualizado em 03/10/2014 10:14

“A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isto vem do Senhor, e é maravilha aos nossos olhos.”

Reunimo-nos hoje na Casa de Deus com o coração cheio de gratidão. Este é o sentimento que deve brotar em nosso coração cada vez que aqui nos reunimos, como Igreja do Senhor, para celebrarmos a Eucaristia: a gratidão. Somos infinitamente gratos a Deus, nosso Pai, que preparou para nós este dia – o Domingo – e que preparou para nós este lugar – sua Casa e nossa Casa, a Casa da Igreja – onde nos reunimos para celebrar o Cristo, nossa Páscoa, nossa Solenidade Semanal, causa da nossa alegria e júbilo, nosso Salvador e Redentor.

Antes de penetrarmos no conteúdo profundo da Palavra de Deus que acabamos de ouvir, gostaria de chamar a atenção, para as orações que compõem a moldura dessa celebração e que nos revelam o sentido profundo do que estamos realizando agora. Poderíamos nos antecipar agora e voltar o nosso olhar para a oração que daqui a pouco vamos fazer sobre as oferendas. Ela nos diz: “Acolhei, ó Deus, nós vos pedimos, o sacrifício que instituístes e, pelos mistérios que celebramos em vossa honra, completai a santificação dos que salvastes”. Deus, nosso Pai, instituiu para nós este mistério que celebramos, a Páscoa do seu Filho, seu sacrifício tornado presente para nós em toda a sua força no altar. E nós, todas as vezes que celebramos estes mistérios em honra do Pai, somos santificados.

O Cristo já ofereceu uma única vez o seu sacrifício para nossa salvação, mas nós, à medida que celebramos os divinos mistérios, à medida em que participamos deste sacrifício, deste culto de louvor ao Pai, por Cristo, no Espírito Santo, somos santificados, somos penetrados pela salvação que Cristo nos alcançou no alto da sua cruz.

É belíssima e, também, profunda, a oração pós-comunhão, que diz: “Possamos, ó Deus onipotente, saciar-nos do pão celeste e inebriar-nos do vinho sagrado, para que sejamos transformados naquele que agora recebemos”. Nós comungamos, meus irmãos, não pão comum nem vinho simplesmente. Nós somos saciados pelo “pão celeste” que é o Corpo de Cristo e pelo “vinho sagrado” que é o Sangue de Cristo. E por que recebemos o Corpo e o Sangue de Cristo? Para que sejamos transformados n’Ele.

Enquanto os alimentos comuns que tomamos se transformam em nós, a Eucaristia, alimento celeste, nos transforma n’Ele, no Cristo nosso Senhor e Deus. Nós comungamos a Eucaristia para tornamo-nos uma Eucaristia, ou seja, para que a nossa vida seja como a de Cristo, um sacrifício de ação de graças ao Pai pelo Espírito. Nós comungamos o Cristo para estarmos unidos a Ele e sermos transformados n’Ele; para que o nosso pensar, o nosso agir e o nosso querer sejam o de Nosso Senhor.

Falando em sacrifício de ação de graças, é desse sacrifício do seu Corpo que Cristo nos fala hoje através da parábola dos “vinhateiros homicidas”. Este trecho que hoje ouvimos está na quinta parte do Evangelho de Mateus, onde Jesus começa a falar sobre o Reino dos Céus. Mateus está narrando o ministério de Jesus na Judéia e em Jerusalém. Jesus está no Templo de Jerusalém e conta esta parábola diante dos sumos-sacerdotes, dos mestres da Lei e dos fariseus. Esta parábola tem o mesmo pano de fundo da que ouvimos domingo passado, trata-se da entrega do Reino dos Céus a um povo que realmente produza frutos, uma vez que os israelitas – primeiros, mas não únicos – destinatários da salvação e da promessa do Pai não acolheram o Cristo, o Messias Salvador.

Jesus ilustra aqui a história do povo escolhido com a parábola da vinha e dos vinhateiros. A imagem da vinha para representar o povo de Israel é muito cara ao Antigo Testamento e aparece em vários profetas:

“Mas eu te plantara uma vinha excelente, toda de cepas legítimas. Como te transformastes para mim em ramos degenerados de uma vinha bastarda?”

“A palavra do Senhor foi-me dirigida nestes termos: Filho do homem, a lenha da vinha por que valeria mais que a de galhos das outras árvores da floresta? Toma-se dela para fazer um objeto? Faz-se mesmo uma cavilha para pendurar o que quer que seja? Eis aí: mete-se no fogo para destruir. Quando o fogo consumir as duas extremidades, e queimar o meio, pode ainda servir para alguma coisa? Quando ele estava intacto, não servia para objeto algum; consumido e queimado pelo fogo, ainda menos poderá servir para qualquer coisa. Eis por que diz o Senhor Deus: assim como entre as árvores da floresta é a madeira da vide que eu lanço ao fogo para consumir, assim lançarei eu os habitantes de Jerusalém. Voltarei contra eles a minha face. Fugirão ao fogo; o fogo, porém, os devorará. Saberão que eu sou o Senhor, quando eu voltar contra eles a minha face, e transformar a terra num deserto, porque me têm sido infiéis - oráculo do Senhor Deus.”

Sobretudo, poderíamos destacar a imagem que hoje nos é apresentada pela primeira leitura, este trecho do capítulo 5 de Isaías. Aqui o profeta canta para o “seu amado” o cântico da vinha de um amigo dele. Neste cântico, o amigo do profeta é o próprio Deus e a vinha o povo de Israel. O profeta descreve então todos os cuidados que Deus teve para com o povo escolhido: “Cercou-a, limpou-a de pedras, plantou videiras escolhidas, edificou uma torre no meio e construiu um lagar.” Todavia, a videira produziu uvas selvagens. O povo de Israel depois de ter sido tirado por Deus do Egito, da terra da escravidão, e ter sido plantado na Terra Prometida, terra onde corre leite e mel , deveria produzir bons frutos, mas produziu apenas frutos ruins: a idolatria, a prostituição com os falsos deuses, a confiança maior no poder estrangeiro do que no Deus forte que os havia tirado com mão forte da casa da escravidão. Sendo assim, diz o próprio Deus no final da parábola, a vinha será abandonada à sua própria sorte, será pisoteada, porque Deus vai remover a sua cerca, e secará, porque Deus não lhe mandará mais as chuvas benfazejas.

Tendo por base este trecho do profeta Isaías, Jesus conta, então, a parábola dos vinhateiros homicidas. Jesus vai demonstrar nessa parábola, que essa fúria de Deus pintada pelo profeta Isaías no cântico da vinha, na verdade foi permeada por muita misericórdia, porque Deus, ao longo da história da salvação, embora tenha permitido que o seu povo escolhido sofresse as consequências do pecado indo e vindo dos dois exílios, nunca os abandonou à própria sorte e sempre esperou pacientemente pelos seus frutos, enviando seus servos, os profetas, que tinham como missão recolher algum fruto da videira do Senhor. Diz Jesus nesta parábola, que os vinhateiros além de não entregarem aos servos do dono da vinha os frutos devidos, ainda espancaram e mataram estes. É a imagem clara dos profetas, enviados por Deus ao povo escolhido para ali recolher algum fruto de conversão, mas estes profetas foram perseguidos e mortos.

Por fim, o Pai, numa explosão de misericórdia, enviou o seu próprio Filho, pensado: “Ao meu Filho eles vão respeitar”. Os vinhateiros não somente não deram ouvidos ao Filho, mas confabularam entre si e resolveram matar o Filho fora da vinha a fim de ficarem eles mesmos com a vinha que era de seu patrão. Jesus pergunta então aos sumos-sacerdotes e aos anciãos do povo o que o patrão, o que esse pai deveria fazer com os vinhateiros e estes respondem, dando contra si próprios a sentença de condenação: “Com certeza mandará matar de modo violento esses perversos e arrendará a vinha a outros vinhateiros, que lhe entregarão os frutos no tempo certo.”

Jesus se coloca no centro dessa parábola. Ele é o Filho enviado pelo Pai, como “um saco cheio da sua misericórdia” como diz São Bernardo de Claraval, a fim de que o povo escolhido produza algum fruto. Mas, Jesus vai ser morto fora de Jerusalém. Sua morte, longe de ser o fim, é na verdade, o grande começo, é o centro de tudo, porque pela sua morte nos veio a salvação. “A pedra que os construtores rejeitaram tornou-se a pedra angular; isto vem do Senhor, e é maravilha aos nossos olhos.” Com estes versículos do Salmo 118 Jesus explica o mistério da sua morte. Rejeitado pelos construtores e lançado fora, Ele se torna a pedra principal, ou seja, aquela que dá sustentação a todo o edifício e, sem a qual, é impossível que as outras pedras fiquem unidas e firmes.

Morrendo fora de Jerusalém Jesus põe termo aos sacrifícios antigos, porque Ele se fez o nosso sacrifício de expiação. De fato, no dia da Expiação, o Sumo Sacerdote entrava no Santo dos Santos e o aspergia com o sangue das vítimas, mas as vítimas eram queimadas fora do acampamento. Jesus, sendo crucificado e tendo morrido fora do acampamento realiza de maneira definitiva o sacrifício pelos nossos pecados, como nos diz a carta aos Hebreus: “Foi por isso que Jesus, para santificar o povo por seu próprio sangue, sofreu do lado de fora da porta.”

Morrendo para nos salvar Jesus nos manifesta o amor infinito do Pai por nós como nos diz São João: “Pois Deus não enviou o seu Filho ao mundo para julgar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por Ele.” e ainda: “Nisto se manifestou o amor de Deus por nós: Deus enviou o seu Filho único ao mundo para que vivamos por ele. Nisto consiste o amor: não fomos nós que amamos a Deus, mas foi ele quem nos amou e enviou-nos o seu Filho como vítima de expiação pelos nossos pecados.”

Jesus dá desfecho a parábola dizendo que, já que os vinhateiros, ou seja, o povo de Israel e seus guias e mestres, não acolheram o Filho, o Messias enviado pelo Pai, a vinha, ou seja, o Reino de Deus, lhes será tirado e será entregue a um povo que produza frutos: aos pagãos e a todos aqueles que aderirem ao Senhor pela fé, porque como nos diz São Paulo: “De sorte que não há distinção entre judeu e grego, pois ele é Senhor de todos, rico para todos os que o invocam.” e ainda São João: “Quem nele crê não é julgado; quem não crê, já está julgado, porque não creu no Nome do Filho único de Deus.”
Os sumos sacerdotes, os fariseus e os mestres da Lei procuram, a partir de então, matar Jesus, porque eles entenderam que era deles que Jesus estava falando: “Ouvindo estas palavras, os altos funcionários do templo e os fariseus entenderam que ele se referia a eles e procuravam capturá-lo, mas tinham medo da multidão que o considerava um profeta.”

Jesus anuncia aqui o mistério da Igreja, novo povo de Deus, constituído a partir do mistério da sua Páscoa, que recebe a missão de produzir frutos, de ser guardiã dos mistérios do Reino. A este povo qualquer um pode pertencer, desde que preste sua adesão a Cristo por meio da fé, e uma fé que não seja estéril, mas que produza frutos de justiça.

Nós somos esse povo queridos irmãos, povo escolhido de Deus, nascido a partir da morte fecunda do Cristo, nosso Senhor e Deus. Devemos nos cuidar, para que a nossa adesão a Cristo não seja estéril e vazia, para que a nossa fé não seja simplesmente como palavras lançadas ao vento. Devemos produzir frutos de justiça que condigam com a fé que professamos. É a isto que nos exorta hoje o grande Apóstolo dos Gentios, São Paulo, neste trecho belíssimo da carta aos Filipenses que acabamos de ouvir:

“Irmãos: Não vos inquieteis com coisa alguma, mas apresentai as vossas necessidades a Deus, em oração e súplicas, acompanhadas de ação de graças. E a paz de Deus, que ultrapassa todo o entendimento guardará os vossos corações e pensamentos em Cristo Jesus. Quanto ao mais, irmãos, ocupai-vos com tudo o que é verdadeiro, respeitável, justo, puro, amável, honroso, tudo o que é virtude ou de qualquer modo mereça louvor. Praticai o que aprendestes e recebestes de mim, ou que de mim vistes e ouvistes. Assim o Deus da paz estará convosco.”

Esses são os frutos que Deus espera de nós: nossa oração confiante; uma vida de constante ação de graças a Deus; uma vida preenchida, apesar de nossas fraquezas, com tudo o que diante de Deus mereça louvor. Agradeçamos ao Senhor hoje nesta Eucaristia por sermos este novo povo, esta nova vinha escolhida, plantada e cuidada pelo nosso Deus de amor. Peçamos hoje nesta Eucaristia, a graça de sermos uma vinha que produza frutos para Deus; peçamos que apesar das nossas fraquezas e apesar das uvas selvagens que tantas vezes nascem em nós, auxiliados pelo Espírito Divino, possamos produzir boas uvas para Deus. Peçamos com o salmista: “Voltai-vos para nós, Deus do universo! Olhai dos altos céus e observai. Visitai a vossa vinha e protegei-a! Foi a vossa mão direita que a plantou; protegei-a, e ao rebento que firmastes! E nunca mais vos deixaremos, Senhor Deus! Dai-nos vida, e louvaremos vosso nome! Convertei-nos, ó Senhor Deus do universo, e sobre nós iluminar a vossa face! Se voltardes para nós, seremos salvos!”

27º Domingo do Tempo Comum

05.10.2014
Is 5,1-7
Sl 79 (80)
Fl 4,6-9
Mt 21,33-43

Padre Fábio Siqueira
Autor

Padre Fábio Siqueira

Vice-diretor das Escolas de Fé e Catequese Mater Ecclesiae e Luz e Vida