Arquidiocese do Rio de Janeiro

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Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, 17/05/2024

17 de Maio de 2024

Nós cremos e reconhecemos que tu és o Santo de Deus

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Nós cremos e reconhecemos que tu és o Santo de Deus

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26/08/2018 00:00

Nós cremos e reconhecemos que tu és o Santo de Deus 0

26/08/2018 00:00

Como já havíamos mencionado em artigos anteriores, neste ciclo de leituras do Ano B, a Igreja nos apresenta, do 17º ao 21º Domingos do Tempo Comum, como Evangelho, o texto de Jo 6: a multiplicação dos pães e o discurso de Jesus sobre o Pão da Vida. Normalmente, a lectio cursiva desse capítulo é interrompida pela Solenidade da Assunção de Nossa Senhora, transferida para o domingo seguinte, como ocorreu no último domingo, onde deveríamos ter ouvido o trecho de Jo 6,51-58, que nos prepara para compreendermos a perícope evangélica deste domingo.

Antes de comentarmos o Evangelho, é conveniente lançar ainda que um breve olhar para a primeira leitura. Os acontecimentos e atitudes nela narrados, de certa forma, nos aproximam daquilo o que se nos apresenta o Evangelho deste domingo.

Trata-se, na primeira leitura, da “assembleia de Siquém”. Josué reúne o povo e os coloca diante de uma decisão a tomar: Escolhei hoje a quem quereis servir... (Js 24,15). O próprio Josué, no entanto, se coloca firmemente como quem escolhe servir o Senhor, juntamente com toda a sua casa. O povo também, recordando as maravilhas operadas por Deus em seu favor (v. 17), escolhe servir o Senhor: Nós também serviremos ao Senhor, porque ele é o nosso Deus (cf. v.18).

O Salmo Responsorial, por sua vez, recorda o que este povo havia experimentado e que os fez escolher servir o Senhor. Particularmente, os vv. 16, 18 e 23: O Senhor pousa seus olhos sobre os justos, e seu ouvido está atento ao seu chamado; Clamam os justos, e o Senhor bondoso escuta e de todas as angústias os liberta; O Senhor liberta a vida dos seus servos... Deus pousou seu olhar sobre o povo de Israel; ouviu seu chamado desde o Egito. O Senhor os escutou, os libertou, e, por isso, eles escolheram servir o Senhor, porque o reconheceram como seu Senhor e Libertador.

O Evangelho, por sua vez, também nos apresenta uma cena que levará o grupo dos discípulos de Jesus a uma decisão. Depois que Jesus anunciou que era necessário “comer a sua carne” e “beber o seu sangue” para ter a vida eterna, “muitos dos discípulos” que o escutaram começam a afirmar: Esta palavra é dura, quem consegue escutá-la?” Mais uma vez eles “murmuram”, como o fizeram em Jo 6,41, quando Jesus afirmou ser Ele mesmo o “pão descido do céu”. Como um corpo que era, aos olhos deles, ainda mortal, poderia ser fonte de imortalidade? Eles ainda viam o Cristo somente com o olhar da carne, e não sabiam que Ele haveria de ressuscitar de entre os mortos, tendo seu Corpo revestido de imortalidade. Por isso, se escandalizam. Eles não conseguem compreender o real sentido das palavras de Jesus.

Jesus responde à murmuração primeiro com uma pergunta: Isto vos escandaliza? Depois, nos vv. 62-63a Jesus faz referência à sua glorificação e à vinda do Espírito. O Filho do Homem vai ser exaltado (v. 62). O Espírito que Ele enviará de junto do Pai, tornará possível a realização do que Ele acabara de anunciar, ou seja, de que é necessário “comer a sua carne e beber o seu sangue”. “Não se trata da carne e do sangue do Jesus terreno, mas da carne e do sangue o Cristo Celeste, do Filho do Homem que, cheio do Espírito, possui um novo modo de existência.”[1]Assim como o corpo morto de Cristo será, na força do Espírito, ressuscitado e transformado em corpo imortal (cf. Rm 8,11), do mesmo modo, o pão e o vinho, alimentos que nada têm de sobrenaturais em si mesmos, serão, pela força do mesmo Espírito, transformados em alimento de imortalidade. Quando ao pão se juntar a Epiclese, este se tornará "Pão da Vida". Quando ao vinho se juntar a Epiclese, este se tornará "Vinho da Salvação" ou, como afirma a expressão latina "Bebida Espiritual". O Espírito assim agindo, transformará a fraqueza em força, o alimento simples em Corpo e Sangue de Cristo que são, para nós, alimento de imortalidade.

Na segunda metade do v. 63, Jesus como que retoma todo o discurso de Jo 6, afirmando que suas palavras são espírito e vida, contudo, alguns fecham o coração à essa mesma Palavra e não creem (v. 64). No v. 66 acontece uma divisão no grupo dos discípulos. “Muitos”, diz João, “voltaram atrás” e não mais andavam com Jesus. A Palavra de Cristo leva sempre a uma decisão: estar ou não com Ele.

Surpreende-nos, no entanto, o que vem em seguida. Nos vv. 67-69 temos uma pergunta de Jesus aos doze que será respondida não pelo grupo, mas por Simão, que toma a frente dos seus irmãos e responde em nome deles. Longe de voltar atrás e de oferecer uma palavra mais atraente, Jesus aproveita a crise no grupo dos discípulos para colocar, à semelhança do que fez Josué na primeira leitura, o grupo dos doze diante de uma decisão radical: Vós também não quereis ir embora?

Podemos imaginar tudo o que deve ter se passado no coração dos doze naquele momento. Diante das grandes decisões que temos que tomar na vida, sempre vem um filme à nossa mente. Tentamos improvisamente pesar os prós e os contras. Os doze, contudo, tinham uma experiência particular com Jesus. Eles não estavam somente atrás de sinais, mas eram o grupo que caminhava com Ele. Essa experiência pessoal é o que dá força a Pedro para responder em nome de todos: A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna...

Não se trata somente de querer ou não ficar. Trata-se de não haver outro caminho. Na construção grega, o objeto vem na frente, para dar ênfase: Palavras de vida eterna tens tu... Pedro reconhece na palavra de Jesus, que é espírito e vida (v. 63b), a palavra de vida eterna que o coração de todo homem anseia.

O evangelho termina com a confissão de fé de Pedro: Nós cremos e reconhecemos que tu és o Santo de Deus. Os doze prestam, pela boca de Pedro, sua adesão de fé. Ao “Eu sou” com o qual Jesus se apresentou de modo recorrente em Jo 6 (6,35.41.48.51) corresponde o “Tu és” pronunciado por Pedro neste último versículo.[2] Pedro reconhece em Jesus o “Santo de Deus”. Assim o apóstolo exprime a íntima relação que existe entre Jesus e o Pai, que o próprio Jesus chama de “Pai Santo” (Jo 17,11) e, ao mesmo tempo, reconhece que Jesus exerce com relação aos seus uma função sacerdotal, uma que, pelos seus, o Cristo “se santifica” (Jo 17,19), a fim de que eles sejam “santificados” na verdade (Jo 17,19).

Pedro se abre, pela fé, ao dom da vida eterna, pois, quem crê, tem a vida eterna, afirma o Cristo (cf. Jo 6,47). Pedro crê e reconhece, e não o faz só por si mesmo, mas pelo grupo dos doze, abrindo assim o caminho da fé para o novo povo de Deus, a Igreja, que tem os apóstolos como fundamento, o Cristo como Pedra Angular, e a Eucaristia como seu perene alimento.

Também nós, diante das angústias e dificuldades da vida, somos tentamos a desistir. Talvez, a Palavra de Cristo possa parecer-nos, em alguns momentos, demasiado dura. No entanto, só Ele tem “palavras de vida eterna”. Que na força do Espírito possamos, como os doze, permanecer firmes, mesmo em meio a grandes dificuldades. E que o alimento da Eucaristia, comunhão com o Cristo presente para nós em seu Corpo e Sangue, seja sempre uma fonte de renovação para nós.



[1] Schnackenburg, R. Il Vangelo di Giovanni. Vol. II. p. 148.

[2] Schnackenburg, R. Il Vangelo di Giovanni. Vol. II. p. 155.

 
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26/08/2018 00:00

Como já havíamos mencionado em artigos anteriores, neste ciclo de leituras do Ano B, a Igreja nos apresenta, do 17º ao 21º Domingos do Tempo Comum, como Evangelho, o texto de Jo 6: a multiplicação dos pães e o discurso de Jesus sobre o Pão da Vida. Normalmente, a lectio cursiva desse capítulo é interrompida pela Solenidade da Assunção de Nossa Senhora, transferida para o domingo seguinte, como ocorreu no último domingo, onde deveríamos ter ouvido o trecho de Jo 6,51-58, que nos prepara para compreendermos a perícope evangélica deste domingo.

Antes de comentarmos o Evangelho, é conveniente lançar ainda que um breve olhar para a primeira leitura. Os acontecimentos e atitudes nela narrados, de certa forma, nos aproximam daquilo o que se nos apresenta o Evangelho deste domingo.

Trata-se, na primeira leitura, da “assembleia de Siquém”. Josué reúne o povo e os coloca diante de uma decisão a tomar: Escolhei hoje a quem quereis servir... (Js 24,15). O próprio Josué, no entanto, se coloca firmemente como quem escolhe servir o Senhor, juntamente com toda a sua casa. O povo também, recordando as maravilhas operadas por Deus em seu favor (v. 17), escolhe servir o Senhor: Nós também serviremos ao Senhor, porque ele é o nosso Deus (cf. v.18).

O Salmo Responsorial, por sua vez, recorda o que este povo havia experimentado e que os fez escolher servir o Senhor. Particularmente, os vv. 16, 18 e 23: O Senhor pousa seus olhos sobre os justos, e seu ouvido está atento ao seu chamado; Clamam os justos, e o Senhor bondoso escuta e de todas as angústias os liberta; O Senhor liberta a vida dos seus servos... Deus pousou seu olhar sobre o povo de Israel; ouviu seu chamado desde o Egito. O Senhor os escutou, os libertou, e, por isso, eles escolheram servir o Senhor, porque o reconheceram como seu Senhor e Libertador.

O Evangelho, por sua vez, também nos apresenta uma cena que levará o grupo dos discípulos de Jesus a uma decisão. Depois que Jesus anunciou que era necessário “comer a sua carne” e “beber o seu sangue” para ter a vida eterna, “muitos dos discípulos” que o escutaram começam a afirmar: Esta palavra é dura, quem consegue escutá-la?” Mais uma vez eles “murmuram”, como o fizeram em Jo 6,41, quando Jesus afirmou ser Ele mesmo o “pão descido do céu”. Como um corpo que era, aos olhos deles, ainda mortal, poderia ser fonte de imortalidade? Eles ainda viam o Cristo somente com o olhar da carne, e não sabiam que Ele haveria de ressuscitar de entre os mortos, tendo seu Corpo revestido de imortalidade. Por isso, se escandalizam. Eles não conseguem compreender o real sentido das palavras de Jesus.

Jesus responde à murmuração primeiro com uma pergunta: Isto vos escandaliza? Depois, nos vv. 62-63a Jesus faz referência à sua glorificação e à vinda do Espírito. O Filho do Homem vai ser exaltado (v. 62). O Espírito que Ele enviará de junto do Pai, tornará possível a realização do que Ele acabara de anunciar, ou seja, de que é necessário “comer a sua carne e beber o seu sangue”. “Não se trata da carne e do sangue do Jesus terreno, mas da carne e do sangue o Cristo Celeste, do Filho do Homem que, cheio do Espírito, possui um novo modo de existência.”[1]Assim como o corpo morto de Cristo será, na força do Espírito, ressuscitado e transformado em corpo imortal (cf. Rm 8,11), do mesmo modo, o pão e o vinho, alimentos que nada têm de sobrenaturais em si mesmos, serão, pela força do mesmo Espírito, transformados em alimento de imortalidade. Quando ao pão se juntar a Epiclese, este se tornará "Pão da Vida". Quando ao vinho se juntar a Epiclese, este se tornará "Vinho da Salvação" ou, como afirma a expressão latina "Bebida Espiritual". O Espírito assim agindo, transformará a fraqueza em força, o alimento simples em Corpo e Sangue de Cristo que são, para nós, alimento de imortalidade.

Na segunda metade do v. 63, Jesus como que retoma todo o discurso de Jo 6, afirmando que suas palavras são espírito e vida, contudo, alguns fecham o coração à essa mesma Palavra e não creem (v. 64). No v. 66 acontece uma divisão no grupo dos discípulos. “Muitos”, diz João, “voltaram atrás” e não mais andavam com Jesus. A Palavra de Cristo leva sempre a uma decisão: estar ou não com Ele.

Surpreende-nos, no entanto, o que vem em seguida. Nos vv. 67-69 temos uma pergunta de Jesus aos doze que será respondida não pelo grupo, mas por Simão, que toma a frente dos seus irmãos e responde em nome deles. Longe de voltar atrás e de oferecer uma palavra mais atraente, Jesus aproveita a crise no grupo dos discípulos para colocar, à semelhança do que fez Josué na primeira leitura, o grupo dos doze diante de uma decisão radical: Vós também não quereis ir embora?

Podemos imaginar tudo o que deve ter se passado no coração dos doze naquele momento. Diante das grandes decisões que temos que tomar na vida, sempre vem um filme à nossa mente. Tentamos improvisamente pesar os prós e os contras. Os doze, contudo, tinham uma experiência particular com Jesus. Eles não estavam somente atrás de sinais, mas eram o grupo que caminhava com Ele. Essa experiência pessoal é o que dá força a Pedro para responder em nome de todos: A quem iremos, Senhor? Tu tens palavras de vida eterna...

Não se trata somente de querer ou não ficar. Trata-se de não haver outro caminho. Na construção grega, o objeto vem na frente, para dar ênfase: Palavras de vida eterna tens tu... Pedro reconhece na palavra de Jesus, que é espírito e vida (v. 63b), a palavra de vida eterna que o coração de todo homem anseia.

O evangelho termina com a confissão de fé de Pedro: Nós cremos e reconhecemos que tu és o Santo de Deus. Os doze prestam, pela boca de Pedro, sua adesão de fé. Ao “Eu sou” com o qual Jesus se apresentou de modo recorrente em Jo 6 (6,35.41.48.51) corresponde o “Tu és” pronunciado por Pedro neste último versículo.[2] Pedro reconhece em Jesus o “Santo de Deus”. Assim o apóstolo exprime a íntima relação que existe entre Jesus e o Pai, que o próprio Jesus chama de “Pai Santo” (Jo 17,11) e, ao mesmo tempo, reconhece que Jesus exerce com relação aos seus uma função sacerdotal, uma que, pelos seus, o Cristo “se santifica” (Jo 17,19), a fim de que eles sejam “santificados” na verdade (Jo 17,19).

Pedro se abre, pela fé, ao dom da vida eterna, pois, quem crê, tem a vida eterna, afirma o Cristo (cf. Jo 6,47). Pedro crê e reconhece, e não o faz só por si mesmo, mas pelo grupo dos doze, abrindo assim o caminho da fé para o novo povo de Deus, a Igreja, que tem os apóstolos como fundamento, o Cristo como Pedra Angular, e a Eucaristia como seu perene alimento.

Também nós, diante das angústias e dificuldades da vida, somos tentamos a desistir. Talvez, a Palavra de Cristo possa parecer-nos, em alguns momentos, demasiado dura. No entanto, só Ele tem “palavras de vida eterna”. Que na força do Espírito possamos, como os doze, permanecer firmes, mesmo em meio a grandes dificuldades. E que o alimento da Eucaristia, comunhão com o Cristo presente para nós em seu Corpo e Sangue, seja sempre uma fonte de renovação para nós.



[1] Schnackenburg, R. Il Vangelo di Giovanni. Vol. II. p. 148.

[2] Schnackenburg, R. Il Vangelo di Giovanni. Vol. II. p. 155.

 
Padre Fábio Siqueira
Autor

Padre Fábio Siqueira

Vice-diretor das Escolas de Fé e Catequese Mater Ecclesiae e Luz e Vida