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Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, 28/03/2024

28 de Março de 2024

Construção na contradição

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Construção na contradição

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24/06/2018 00:00

Construção na contradição 0

24/06/2018 00:00

Vivemos tempos interessantes quando parece que as contradições, que sempre existiram, passaram a ser ainda mais evidentes ou maiores em todos os níveis e circunstâncias de nossas vidas.

Ao chegarmos ao patamar de consciência da vida humana, política, cultural e social, depois de tantas declarações dos direitos da pessoa humana, era de se supor que tivéssemos comportamentos consequentes com os passos já dados.

No entanto, parece que continuamos a caminhar nessa autoconsciência, ao mesmo tempo em que vivemos tristes realidades, quando a vida e o relacionamento humanos parecem valer menos que outro ser vivo, ou até inanimado.

Temos visto isso com relação à consciência de construção de uma cultura de paz e o aumento da violência nas guerras internacionais e urbanas que assistimos a cada dia, parecendo que continuamos reféns dentro de nossas casas. Todos concordam que a paz é importante, é um valor necessário e, no entanto, tem-se a sensação de que a cada dia ela fica ainda mais longe. Não faltam projetos para tentar trazê-la mais perto de nós, mas os resultados alcançados ainda são pequenos e poucos.

Quanto ao valor da vida, então, acredito que nunca chegamos tão alto em valorizá-la, a ponto de termos leis severas até com relação à vida dos animais e vegetais. Quem não se recorda das campanhas que se fazem para que não matem os animais e o discurso amazônico com relação ao desmatamento, valorizando a floresta com suas árvores e a biodiversidade? Sem dúvida que são campanhas importantes que demonstram o grau de responsabilidade a que chegamos em nossa civilização.

Mas, infelizmente, com relação a esse mesmo tema, quanto desvalorizamos a vida do idoso e doente tentando resolver a questão da não produtividade e das dores com a eutanásia. O mesmo se diga com relação à vida do ser humano concebido e, portanto, já existente, e a facilidade em matá-lo só porque ainda está no ventre de sua mãe, com as campanhas cada vez maiores para a aprovação da lei do aborto. Com relação a este tema, o Brasil é a “bola da vez”, e nossas autoridades repetem à exaustão os argumentos ‘sim’ postos a elas pelas organizações internacionais.

Não sei como conseguiremos melhorar a nossa sociedade, semeando a mentalidade de uma cultura de violência e de morte com as defesas que se fazem dessas atitudes que já têm suas consequências em nosso tecido social e, sem dúvida, terá muitas outras no futuro. Estamos construindo o futuro sobre essas bases, nas quais os valores humanos, devido às contradições de nosso tempo, na prática estão sendo espezinhados, embora na teoria os livros falem de atitudes importantes e belas com relação ao avanço dessa consciência.

Chegamos a níveis de produção de alimentos nunca vistos antes, que até mesmo as organizações internacionais existentes para o relacionamento internacional tentam intermediar relacionamentos comerciais para que as exportações ora existentes respeitem certas regras de boa convivência entre as nações. No entanto, em grande parte dos continentes do nosso planeta, e infelizmente ainda também em nosso país, temos pessoas que passam fome. Quantos ainda se alimentam dos restos que caem das mesas e que são jogados no lixo! A dignidade humana aviltada clama aos céus!

A consciência da liberdade e do valor da opinião tem aumentado! Todos querem ter vez e opinião diante dos acontecimentos e votos nas assembleias e decisões. Mas, ao mesmo tempo, um conceito mal compreendido de liberdade tem levado a sociedade a decisões que contraditoriamente vão contra a própria liberdade e a dignidade humana. Assistimos perplexos a situações anômalas que nos levam a pensar sobre as filosofias que hoje conduzem a nossa cultura e as transformações que ora vivemos. Vemos que falta, sem dúvida, uma base sólida para construirmos a verdadeira liberdade e trilharmos os caminhos de tempos novos.

Poderíamos continuar recordando a importância da honestidade, ao mesmo tempo em que cresce a corrupção; o aumento da comunicação, enquanto cresce a desinformação e os condicionamentos; a crescente religiosidade em contradição com o aumento dos que não creem em ninguém; a vida de entendimento entre os povos e a separação em nações das diversas raças; a alegria de avançar e, também, de retroceder, e assim uma ladainha de sinais de contradição ao nosso redor.

E tudo isso depende de atitudes que tomamos, opiniões que emitimos, soluções que damos. É também verdade que nem sempre somos conscientes do que fazemos, já que muitas vezes somos levados pelas circunstâncias e não tanto pela opinião tomada e decidida com clareza.

Não se trata de opiniões levadas por uma visão religiosa do mundo, trata-se aqui de valores humanos e de consequências que temos assistido. Acredito que a visão cristã da sociedade também nos ajudaria neste tempo, mas no mundo plural que temos somos chamados a encontrar valores comuns.

Assim como assistimos hoje, talvez pela primeira vez na História, o homem mudando o seu planeta com as consequências de decisões tomadas que estão levando ao aquecimento global, para não citar outros fenômenos que são consequências da ação da pessoa humana, também assistimos a uma mudança de época: o que será o mundo sonhado para amanhã, nós o estamos construindo com as decisões de hoje. Grande responsabilidade a nossa!

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Construção na contradição

24/06/2018 00:00

Vivemos tempos interessantes quando parece que as contradições, que sempre existiram, passaram a ser ainda mais evidentes ou maiores em todos os níveis e circunstâncias de nossas vidas.

Ao chegarmos ao patamar de consciência da vida humana, política, cultural e social, depois de tantas declarações dos direitos da pessoa humana, era de se supor que tivéssemos comportamentos consequentes com os passos já dados.

No entanto, parece que continuamos a caminhar nessa autoconsciência, ao mesmo tempo em que vivemos tristes realidades, quando a vida e o relacionamento humanos parecem valer menos que outro ser vivo, ou até inanimado.

Temos visto isso com relação à consciência de construção de uma cultura de paz e o aumento da violência nas guerras internacionais e urbanas que assistimos a cada dia, parecendo que continuamos reféns dentro de nossas casas. Todos concordam que a paz é importante, é um valor necessário e, no entanto, tem-se a sensação de que a cada dia ela fica ainda mais longe. Não faltam projetos para tentar trazê-la mais perto de nós, mas os resultados alcançados ainda são pequenos e poucos.

Quanto ao valor da vida, então, acredito que nunca chegamos tão alto em valorizá-la, a ponto de termos leis severas até com relação à vida dos animais e vegetais. Quem não se recorda das campanhas que se fazem para que não matem os animais e o discurso amazônico com relação ao desmatamento, valorizando a floresta com suas árvores e a biodiversidade? Sem dúvida que são campanhas importantes que demonstram o grau de responsabilidade a que chegamos em nossa civilização.

Mas, infelizmente, com relação a esse mesmo tema, quanto desvalorizamos a vida do idoso e doente tentando resolver a questão da não produtividade e das dores com a eutanásia. O mesmo se diga com relação à vida do ser humano concebido e, portanto, já existente, e a facilidade em matá-lo só porque ainda está no ventre de sua mãe, com as campanhas cada vez maiores para a aprovação da lei do aborto. Com relação a este tema, o Brasil é a “bola da vez”, e nossas autoridades repetem à exaustão os argumentos ‘sim’ postos a elas pelas organizações internacionais.

Não sei como conseguiremos melhorar a nossa sociedade, semeando a mentalidade de uma cultura de violência e de morte com as defesas que se fazem dessas atitudes que já têm suas consequências em nosso tecido social e, sem dúvida, terá muitas outras no futuro. Estamos construindo o futuro sobre essas bases, nas quais os valores humanos, devido às contradições de nosso tempo, na prática estão sendo espezinhados, embora na teoria os livros falem de atitudes importantes e belas com relação ao avanço dessa consciência.

Chegamos a níveis de produção de alimentos nunca vistos antes, que até mesmo as organizações internacionais existentes para o relacionamento internacional tentam intermediar relacionamentos comerciais para que as exportações ora existentes respeitem certas regras de boa convivência entre as nações. No entanto, em grande parte dos continentes do nosso planeta, e infelizmente ainda também em nosso país, temos pessoas que passam fome. Quantos ainda se alimentam dos restos que caem das mesas e que são jogados no lixo! A dignidade humana aviltada clama aos céus!

A consciência da liberdade e do valor da opinião tem aumentado! Todos querem ter vez e opinião diante dos acontecimentos e votos nas assembleias e decisões. Mas, ao mesmo tempo, um conceito mal compreendido de liberdade tem levado a sociedade a decisões que contraditoriamente vão contra a própria liberdade e a dignidade humana. Assistimos perplexos a situações anômalas que nos levam a pensar sobre as filosofias que hoje conduzem a nossa cultura e as transformações que ora vivemos. Vemos que falta, sem dúvida, uma base sólida para construirmos a verdadeira liberdade e trilharmos os caminhos de tempos novos.

Poderíamos continuar recordando a importância da honestidade, ao mesmo tempo em que cresce a corrupção; o aumento da comunicação, enquanto cresce a desinformação e os condicionamentos; a crescente religiosidade em contradição com o aumento dos que não creem em ninguém; a vida de entendimento entre os povos e a separação em nações das diversas raças; a alegria de avançar e, também, de retroceder, e assim uma ladainha de sinais de contradição ao nosso redor.

E tudo isso depende de atitudes que tomamos, opiniões que emitimos, soluções que damos. É também verdade que nem sempre somos conscientes do que fazemos, já que muitas vezes somos levados pelas circunstâncias e não tanto pela opinião tomada e decidida com clareza.

Não se trata de opiniões levadas por uma visão religiosa do mundo, trata-se aqui de valores humanos e de consequências que temos assistido. Acredito que a visão cristã da sociedade também nos ajudaria neste tempo, mas no mundo plural que temos somos chamados a encontrar valores comuns.

Assim como assistimos hoje, talvez pela primeira vez na História, o homem mudando o seu planeta com as consequências de decisões tomadas que estão levando ao aquecimento global, para não citar outros fenômenos que são consequências da ação da pessoa humana, também assistimos a uma mudança de época: o que será o mundo sonhado para amanhã, nós o estamos construindo com as decisões de hoje. Grande responsabilidade a nossa!

Cardeal Orani João Tempesta
Autor

Cardeal Orani João Tempesta

Arcebispo da Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro