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Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, 17/05/2024

17 de Maio de 2024

“Bem-aventurados os pobres em espírito”

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17 de Maio de 2024

“Bem-aventurados os pobres em espírito”

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27/01/2017 12:25 - Atualizado em 27/01/2017 12:25

“Bem-aventurados os pobres em espírito” 0

27/01/2017 12:25 - Atualizado em 27/01/2017 12:25

No Domingo, Dia do Senhor, somos reunidos na Igreja e temos a graça de nos alimentar da Palavra de Deus e do Corpo e Sangue de Cristo. A liturgia da Palavra deste domingo põe diante dos nossos olhos uma dupla temática: a “pobreza do homem” e o “cuidado de Deus”.

Na primeira leitura temos dois trechos do profeta Sofonias. O primeiro trecho é 2,3 onde ressoa um grito que exorta o ouvinte da Palavra a buscar o Senhor: Buscai o Senhor... Buscai a justiça... Buscai a humildade... Nosso lecionário traduz esses três verbos de forma diferente, mas no original hebraico se trata sempre da mesma palavra: “buscai” ou “procurai” (duas possíveis traduções). Aquele que ouve a Palavra do profeta é exortado a “buscar o Senhor” e isso significa “buscar a humildade e a justiça”. Tal exortação vem acompanhada de uma promessa: Achareis talvez um refúgio no dia da cólera do Senhor. O segundo trecho traz de modo mais explícito e contundente uma promessa do Senhor. Depois do “dia da ira” subsistirá no meio de Israel um punhado de homens “pobres e humildes” e a esperança de Israel estará então no Senhor, no seu “nome”. O mal há de desaparecer do meio do povo, e a paz que Deus tanto deseja para esse mesmo povo haverá de reinar, pois ele “será apascentado” e “repousará”.

O Salmo também se mantém neste horizonte de uma dupla temática, onde a “pobreza do homem” e o “cuidado de Deus” são manifestos. O Salmo 145 (146) é um salmo aleluiático, ou seja, um daqueles que começam com a expressão “aleluia”, que significa “Louvai o Senhor!” Na sua primeira parte, nos vv. 1-6, o salmista canta o louvor de Deus exortando os homens a não colocar sua esperança nos nobres, nos “filhos dos homens”, mas, sim, unicamente em Deus, pois enquanto os nobres, os “filhos dos homens”, não podem salvar porque são meros mortais, Deus é o “criador” de tudo o que existe (cf. v. 6). Para a liturgia da Palavra deste domingo foram recortados os vv. 7-10 do salmo e a parte final do v. 6. A primeira estrofe começa com a parte final do v. 6: “O Senhor é fiel para sempre”. Nos vv. 7-9 encontramos uma enumeração de sete coisas que o Senhor faz em favor de diversas categorias de pessoas, que representam o conjunto dos “pobres”, mostrando que a pobreza da qual a Escritura trata vai além daquela material, embora seja também esta:

 

Faz Justiça

Aos oprimidos

Dá pão

Aos famintos

Liberta

Os prisioneiros

Abre os olhos

Dos cegos

Endireita

Os curvados

Protege

O Estrangeiro

Sustenta

O órfão e a viúva

 

E para mostrar que Deus é um juiz justo, que também não fecha seus olhos para a maldade, o salmista assevera nos vv. 9bc: Ele ampara a viúva e o órfão, mas confunde (torna tortuoso) os caminhos dos maus.

A máxima expressão desse cuidado amoroso de Deus com todos os pobres, com todos aqueles que sofrem, nos é apresentada no Evangelho deste domingo, as bem-aventuranças segundo Mateus, que é o evangelho sinótico que nos acompanhará neste Ano A: Mt 5,1-12a. Trata-se da abertura do “grande sermão da montanha” que começa justamente com Jesus nos ensinando quais são as “disposições do coração” necessárias para que possamos cumprir de fato, a Lei dada a nós, por Deus, no Sinai, através de Moisés.

O evangelho tem a seguinte estrutura:

vv.1-2: Introdução

vv.3-11: Bem-aventuranças ou “macarismos”

v.12: Conclusão

As bem-aventuranças são chamadas também de “macarismos”, por causa do termo “makários” que é utilizado neste trecho por Mateus. O termo “makarioi”, plural de “makários”, “bem-aventurados”, introduz os vv. 3-11, aparecendo num total de 9 vezes neste trecho evangélico.

O que significa exatamente essa palavra? No mundo grego, o termo era utilizado, em tempos antigos, para indicar sobretudo o estado feliz dos deuses, que estavam livres dos trabalhos e sofrimentos do homem terreno. Em geral para designar a felicidade humana se utilizava o termo “eudaimonia”. Depois de Aristóteles, parece que o termo começa a ser usado num sentido mais fraco, até mesmo para designar o estado dos ricos, mas sempre num sentido de se estar livre do peso da vida terrena.

No Antigo Testamento, por sua vez, o termo “makários” (bem-aventurado) é muito comum na literatura sapiencial e, também, na tradução grega do saltério. Entre tantas coisas que poderíamos dizer sobre o que significa ser “bem-aventurado” no Antigo Testamento, uma delas é que o homem “makários” é aquele que tem como base da sua vida a obediência à Palavra de Deus (cf. Sl 1,1/34,9/41,2/112,1 etc). Ou aquele que é perdoado por Deus (cf. Sl 32,2).

Nos sinóticos o termo ocorre em Mateus e Lucas. Em Mateus, além de aparecer no trecho deste domingo, aparece também em 13,16. Em Lucas encontramos o termo em 6,20.21.22; 10,23; 11,28; 12,37; 12,38. A grande marca das bem-aventuranças no NT é que sobre todos os bens “seculares” está um “bem supremo”, o “Reino de Deus” ou o “Reino dos Céus”, como vai dizer Mateus. O termo “bem-aventurança” conserva melhor essa ideia de uma felicidade perfeita ainda por vir.

Quem são os bens-aventurados segundo Mateus? Mateus nos enumera nove bem-aventuranças, contudo examinemos primeiro as oito primeiras: os vv. 3-10. As duas primeiras como que sintetizam os diversos gêneros de “pobreza” na qual pode viver o ser humano: pobres em espírito e aflitos. Quem são esses “pobres em espírito” e esses “aflitos”? Pobres em espírito: este termo aparece em literatura extrabíblica, próxima ao período de composição do Novo Testamento, e descreve alguém que tem consciência da pobreza de todo recursos humano e, por isso, reconhece sua necessidade de Deus. Aflitos: o termo designa literalmente, no evangelho, “os que choram”. Os que choram seu pecado ou que que se lamentam pelo que, na história da humanidade afasta os homens de Deus? Seja qual for a interpretação dada ao versículo, a presença do verbo “parakaleo” (consolar) liga o v. a Is 40,1: “Consolai, consolai o meu povo”.

Do v. 5 em diante as bem-aventuranças misturam ora a necessidade dos homens, ora virtudes que Deus quer que estejam presentes no coração dos mesmos homens: bem-aventurados os mansos, bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, bem-aventurados os misericordiosos etc.

A estrutura do texto, contudo, nos faz olhar para a última das bem-aventuranças. No v. 11 temos uma estrutura muito mais desenvolvida, com a presença de diversos outros elementos. Neste versículo são bem-aventurados os que são: injuriados, perseguidos e difamados, “por causa do Cristo”. A estes, é prometida uma grande recompensa, que de certa forma, sintetiza todas as outras que acompanham no decorrer do texto as bem-aventuranças: “será grande a vossa recompensa nos céus”.

Que possamos fazer do evangelho a fonte de toda a nossa sabedoria. Conforma Paulo afirma na segunda leitura, Deus escolheu o que o mundo considera estúpido, para confundir os sábios. Para o mundo, o caminho das bem-aventuranças pode parecer “estúpido” e sem sentido. Para nós cristãos, contudo, trata-se da verdadeira sabedoria, aquela que nos conduzirá à vida eterna. Que possamos seguir por esse caminho, confiando sempre no Senhor que nos sustenta e cuida de nós no meio de todas as nossas pobrezas.


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27/01/2017 12:25 - Atualizado em 27/01/2017 12:25

No Domingo, Dia do Senhor, somos reunidos na Igreja e temos a graça de nos alimentar da Palavra de Deus e do Corpo e Sangue de Cristo. A liturgia da Palavra deste domingo põe diante dos nossos olhos uma dupla temática: a “pobreza do homem” e o “cuidado de Deus”.

Na primeira leitura temos dois trechos do profeta Sofonias. O primeiro trecho é 2,3 onde ressoa um grito que exorta o ouvinte da Palavra a buscar o Senhor: Buscai o Senhor... Buscai a justiça... Buscai a humildade... Nosso lecionário traduz esses três verbos de forma diferente, mas no original hebraico se trata sempre da mesma palavra: “buscai” ou “procurai” (duas possíveis traduções). Aquele que ouve a Palavra do profeta é exortado a “buscar o Senhor” e isso significa “buscar a humildade e a justiça”. Tal exortação vem acompanhada de uma promessa: Achareis talvez um refúgio no dia da cólera do Senhor. O segundo trecho traz de modo mais explícito e contundente uma promessa do Senhor. Depois do “dia da ira” subsistirá no meio de Israel um punhado de homens “pobres e humildes” e a esperança de Israel estará então no Senhor, no seu “nome”. O mal há de desaparecer do meio do povo, e a paz que Deus tanto deseja para esse mesmo povo haverá de reinar, pois ele “será apascentado” e “repousará”.

O Salmo também se mantém neste horizonte de uma dupla temática, onde a “pobreza do homem” e o “cuidado de Deus” são manifestos. O Salmo 145 (146) é um salmo aleluiático, ou seja, um daqueles que começam com a expressão “aleluia”, que significa “Louvai o Senhor!” Na sua primeira parte, nos vv. 1-6, o salmista canta o louvor de Deus exortando os homens a não colocar sua esperança nos nobres, nos “filhos dos homens”, mas, sim, unicamente em Deus, pois enquanto os nobres, os “filhos dos homens”, não podem salvar porque são meros mortais, Deus é o “criador” de tudo o que existe (cf. v. 6). Para a liturgia da Palavra deste domingo foram recortados os vv. 7-10 do salmo e a parte final do v. 6. A primeira estrofe começa com a parte final do v. 6: “O Senhor é fiel para sempre”. Nos vv. 7-9 encontramos uma enumeração de sete coisas que o Senhor faz em favor de diversas categorias de pessoas, que representam o conjunto dos “pobres”, mostrando que a pobreza da qual a Escritura trata vai além daquela material, embora seja também esta:

 

Faz Justiça

Aos oprimidos

Dá pão

Aos famintos

Liberta

Os prisioneiros

Abre os olhos

Dos cegos

Endireita

Os curvados

Protege

O Estrangeiro

Sustenta

O órfão e a viúva

 

E para mostrar que Deus é um juiz justo, que também não fecha seus olhos para a maldade, o salmista assevera nos vv. 9bc: Ele ampara a viúva e o órfão, mas confunde (torna tortuoso) os caminhos dos maus.

A máxima expressão desse cuidado amoroso de Deus com todos os pobres, com todos aqueles que sofrem, nos é apresentada no Evangelho deste domingo, as bem-aventuranças segundo Mateus, que é o evangelho sinótico que nos acompanhará neste Ano A: Mt 5,1-12a. Trata-se da abertura do “grande sermão da montanha” que começa justamente com Jesus nos ensinando quais são as “disposições do coração” necessárias para que possamos cumprir de fato, a Lei dada a nós, por Deus, no Sinai, através de Moisés.

O evangelho tem a seguinte estrutura:

vv.1-2: Introdução

vv.3-11: Bem-aventuranças ou “macarismos”

v.12: Conclusão

As bem-aventuranças são chamadas também de “macarismos”, por causa do termo “makários” que é utilizado neste trecho por Mateus. O termo “makarioi”, plural de “makários”, “bem-aventurados”, introduz os vv. 3-11, aparecendo num total de 9 vezes neste trecho evangélico.

O que significa exatamente essa palavra? No mundo grego, o termo era utilizado, em tempos antigos, para indicar sobretudo o estado feliz dos deuses, que estavam livres dos trabalhos e sofrimentos do homem terreno. Em geral para designar a felicidade humana se utilizava o termo “eudaimonia”. Depois de Aristóteles, parece que o termo começa a ser usado num sentido mais fraco, até mesmo para designar o estado dos ricos, mas sempre num sentido de se estar livre do peso da vida terrena.

No Antigo Testamento, por sua vez, o termo “makários” (bem-aventurado) é muito comum na literatura sapiencial e, também, na tradução grega do saltério. Entre tantas coisas que poderíamos dizer sobre o que significa ser “bem-aventurado” no Antigo Testamento, uma delas é que o homem “makários” é aquele que tem como base da sua vida a obediência à Palavra de Deus (cf. Sl 1,1/34,9/41,2/112,1 etc). Ou aquele que é perdoado por Deus (cf. Sl 32,2).

Nos sinóticos o termo ocorre em Mateus e Lucas. Em Mateus, além de aparecer no trecho deste domingo, aparece também em 13,16. Em Lucas encontramos o termo em 6,20.21.22; 10,23; 11,28; 12,37; 12,38. A grande marca das bem-aventuranças no NT é que sobre todos os bens “seculares” está um “bem supremo”, o “Reino de Deus” ou o “Reino dos Céus”, como vai dizer Mateus. O termo “bem-aventurança” conserva melhor essa ideia de uma felicidade perfeita ainda por vir.

Quem são os bens-aventurados segundo Mateus? Mateus nos enumera nove bem-aventuranças, contudo examinemos primeiro as oito primeiras: os vv. 3-10. As duas primeiras como que sintetizam os diversos gêneros de “pobreza” na qual pode viver o ser humano: pobres em espírito e aflitos. Quem são esses “pobres em espírito” e esses “aflitos”? Pobres em espírito: este termo aparece em literatura extrabíblica, próxima ao período de composição do Novo Testamento, e descreve alguém que tem consciência da pobreza de todo recursos humano e, por isso, reconhece sua necessidade de Deus. Aflitos: o termo designa literalmente, no evangelho, “os que choram”. Os que choram seu pecado ou que que se lamentam pelo que, na história da humanidade afasta os homens de Deus? Seja qual for a interpretação dada ao versículo, a presença do verbo “parakaleo” (consolar) liga o v. a Is 40,1: “Consolai, consolai o meu povo”.

Do v. 5 em diante as bem-aventuranças misturam ora a necessidade dos homens, ora virtudes que Deus quer que estejam presentes no coração dos mesmos homens: bem-aventurados os mansos, bem-aventurados os que têm fome e sede de justiça, bem-aventurados os misericordiosos etc.

A estrutura do texto, contudo, nos faz olhar para a última das bem-aventuranças. No v. 11 temos uma estrutura muito mais desenvolvida, com a presença de diversos outros elementos. Neste versículo são bem-aventurados os que são: injuriados, perseguidos e difamados, “por causa do Cristo”. A estes, é prometida uma grande recompensa, que de certa forma, sintetiza todas as outras que acompanham no decorrer do texto as bem-aventuranças: “será grande a vossa recompensa nos céus”.

Que possamos fazer do evangelho a fonte de toda a nossa sabedoria. Conforma Paulo afirma na segunda leitura, Deus escolheu o que o mundo considera estúpido, para confundir os sábios. Para o mundo, o caminho das bem-aventuranças pode parecer “estúpido” e sem sentido. Para nós cristãos, contudo, trata-se da verdadeira sabedoria, aquela que nos conduzirá à vida eterna. Que possamos seguir por esse caminho, confiando sempre no Senhor que nos sustenta e cuida de nós no meio de todas as nossas pobrezas.


Padre Fábio Siqueira
Autor

Padre Fábio Siqueira

Vice-diretor das Escolas de Fé e Catequese Mater Ecclesiae e Luz e Vida