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Arquidiocese de São Sebastião do Rio de Janeiro, 17/05/2024

17 de Maio de 2024

Vinho novo da alegria

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Vinho novo da alegria

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15/01/2016 18:00 - Atualizado em 15/01/2016 18:01

Vinho novo da alegria 0

15/01/2016 18:00 - Atualizado em 15/01/2016 18:01

É sempre importante olharmos, além das leituras bíblicas, também os textos eucológicos que a Sagrada Liturgia nos apresenta. Hoje, na oração coleta, o sacerdote diz: “Deus eterno e todo-poderoso, que governais o céu e a terra, escutai com bondade as preces do vosso povo e dai ao nosso tempo a vossa paz”. Sim, Deus é aquele que governa todo o universo e hoje, bem no início de um novo ano, esse pedido de “paz” para o nosso tempo ressoa aos nossos ouvidos. Precisamos de “paz verdadeira”, que mais do que ausência de tribulações é a certeza da presença de Cristo que guia e conduz a história da humanidade, embora tantas vezes possa parecer que o barco da existência humana anda à deriva.

Na primeira leitura ouvimos um trecho do Trito-Isaías. Estes últimos capítulos do profeta foram escritos no pós-exílio. Temos neste trecho uma profecia com relação à Jerusalém. Deus promete que não se calará, enquanto não surgir, sobre a Cidade Santa e sobre o povo eleito, como uma luz, a “justiça” e a “salvação”. A profecia traz uma imagem matrimonial. A cidade não mais será chamada “desamparada”. Ela receberá um nome novo. Deus e o povo hão de desposar a cidade santa e Jerusalém para Deus uma alegria, tal qual aquela que é a esposa para o esposo.

Várias vezes encontramos essa imagem matrimonial nos profetas para designar a relação de Deus com o seu povo. De fato, o amor matrimonial numa sociedade monogâmica indica uma relação de especial predileção e exclusividade. Assim é o amor de Deus pela humanidade: um amor esponsal. Nesse amor esponsal Deus é o marido fidelíssimo que jamais abandona a sua esposa, ainda que esta tantas vezes lhe seja infiel, como vemos em outro profeta, Oséias, nos seus três primeiros capítulos, onde a vida do profeta e o seu matrimônio com uma mulher adúltera torna-se uma imagem da relação de Deus com o seu povo.

A história da salvação vem assim apresentada como uma grande celebração de núpcias, onde Deus espera ansiosamente o momento de desposar o seu povo, definitivamente. É o que se dá no Evangelho, quando o primeiro dos “sinais” de Jesus se realiza dentro de uma festa de casamento, demonstrando-nos assim que, a salvação trazida por Cristo, o Mistério da sua Páscoa, é o grande casamento de Deus com a humanidade.

O Evangelho é sempre o coração de toda a liturgia da Palavra. É a luz dele que relemos o Antigo Testamento e, descobrimos então neste vasto universo, o mistério de Cristo.  Depois de apresentar ao seu Filho a situação dos noivos e de receber dele uma resposta – a de que ainda não havia chegado a sua “hora” – ela mesma, Maria, vai dizer aos funcionários: Fazei tudo o que Ele vos disser. Em todo o Evangelho essa parece ser a mais significativa frase da Virgem Maria. Ela nos projeta para o Cristo e nos faz olhar para Ele, ouvindo e guardando em nosso coração a Sua Palavra, como ela mesmo o fez de maneira perfeita.

Abre-se, então, a terceira parte da passagem: a realização do milagre. Jesus dá uma ordem à qual os serviçais obedecem prontamente. Eles enchem as talhas, seis, com 100 litros cada, e as levam ao mestre sala. Este, ao provar a água, percebe que se trata de um vinho melhor, muito melhor do que até então vinha sendo servido.

As últimas duas partes da passagem nos trazem respectivamente o diálogo entre o mestre sala e os noivos e a conclusão, que nos mostra que o início dos sinais de Jesus se deu ali, em Caná. A conclusão se reveste de uma particular importância porque ela nos revela que, a partir deste sinal, a “glória” de Jesus se manifestou e seus discípulos “creram” nele. O milagre serve, assim, para suscitar a fé.

Esta passagem resume para nós a história da salvação. O vinho primeiro pode ser entendido como a primeira aliança. Este era bom, mas ainda imperfeito, uma vez que a primeira aliança era sinal e prefiguração de uma aliança melhor, àquela que deveria se realizar em Cristo. O vinho novo, que causa a admiração do mestre-sala, é a Nova Aliança, a que Cristo nos traz, e que supera infinitamente a antiga. Aliás, convém lembrar que muitas vezes no Antigo Testamento o vinho, sinal de alegria e prosperidade (cf. Sl 104,15), aparece ligado ao festim escatológico (cf. Am 9,13; Is 25,6 etc), que aqui é inaugurado por Cristo nas Bodas de Caná.

Em se tratando da celebração da Eucaristia, contexto no qual este texto é lido hoje este evangelho, convém ressaltar a ligação desta imagem do vinho novo com a Eucaristia. A Eucaristia é antecipação do festim que será realizado nos céus. Ela é a renovação constante do banquete messiânico inaugurado por Cristo na última ceia e que é, de certa forma, prenunciado nesta passagem. O vinho novo da alegria é o Sangue de Cristo, dado a nós para que tenhamos vida em abundância.

A liturgia é não só memória e realização, mas também profecia. Celebramos o Mistério da Páscoa na expectativa da consumação dos tempos. Enquanto aguardamos este dia, vivendo no tempo da Igreja, cumpre-nos seguir aquilo o que a Palavra de Deus nos orienta a fim de que a vida cristã seja, de fato, cristã. Por isso, precisamos colher também uma lição da segunda leitura. Trata-se de um trecho do cap. 12 da 1 Coríntios, onde Paulo fala aos seus irmãos a respeito dos dons. Poderíamos ficar com dois versículos: os dons são diversos, mas um mesmo é o Espírito (cf. v. 4) e ainda “a casa um é dada a manifestação do Espírito para o bem comum” (cf. v. 7).

Não importa qual seja o dom com o qual tenhamos sido agraciados pelo Senhor, devemos ser sempre gratos, pois foi o único e mesmo Espírito do Senhor que nos agraciou com tal dom, chamando-nos a servir à Igreja por este meio. Importa, também, recordar, que os dons não são para nós, mas sim para o “bem comum”. Seja qual for o dom que recebemos de Deus Ele não é para nos enaltecer e, sim, para servirmos ao mesmo Deus por meio dos irmãos.

Que o Senhor nos ajude a viver assim, servindo sempre com humildade, obedecendo à voz do Cristo, como ordenou aos servos do Evangelho a Santa Virgem Maria!

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Vinho novo da alegria

15/01/2016 18:00 - Atualizado em 15/01/2016 18:01

É sempre importante olharmos, além das leituras bíblicas, também os textos eucológicos que a Sagrada Liturgia nos apresenta. Hoje, na oração coleta, o sacerdote diz: “Deus eterno e todo-poderoso, que governais o céu e a terra, escutai com bondade as preces do vosso povo e dai ao nosso tempo a vossa paz”. Sim, Deus é aquele que governa todo o universo e hoje, bem no início de um novo ano, esse pedido de “paz” para o nosso tempo ressoa aos nossos ouvidos. Precisamos de “paz verdadeira”, que mais do que ausência de tribulações é a certeza da presença de Cristo que guia e conduz a história da humanidade, embora tantas vezes possa parecer que o barco da existência humana anda à deriva.

Na primeira leitura ouvimos um trecho do Trito-Isaías. Estes últimos capítulos do profeta foram escritos no pós-exílio. Temos neste trecho uma profecia com relação à Jerusalém. Deus promete que não se calará, enquanto não surgir, sobre a Cidade Santa e sobre o povo eleito, como uma luz, a “justiça” e a “salvação”. A profecia traz uma imagem matrimonial. A cidade não mais será chamada “desamparada”. Ela receberá um nome novo. Deus e o povo hão de desposar a cidade santa e Jerusalém para Deus uma alegria, tal qual aquela que é a esposa para o esposo.

Várias vezes encontramos essa imagem matrimonial nos profetas para designar a relação de Deus com o seu povo. De fato, o amor matrimonial numa sociedade monogâmica indica uma relação de especial predileção e exclusividade. Assim é o amor de Deus pela humanidade: um amor esponsal. Nesse amor esponsal Deus é o marido fidelíssimo que jamais abandona a sua esposa, ainda que esta tantas vezes lhe seja infiel, como vemos em outro profeta, Oséias, nos seus três primeiros capítulos, onde a vida do profeta e o seu matrimônio com uma mulher adúltera torna-se uma imagem da relação de Deus com o seu povo.

A história da salvação vem assim apresentada como uma grande celebração de núpcias, onde Deus espera ansiosamente o momento de desposar o seu povo, definitivamente. É o que se dá no Evangelho, quando o primeiro dos “sinais” de Jesus se realiza dentro de uma festa de casamento, demonstrando-nos assim que, a salvação trazida por Cristo, o Mistério da sua Páscoa, é o grande casamento de Deus com a humanidade.

O Evangelho é sempre o coração de toda a liturgia da Palavra. É a luz dele que relemos o Antigo Testamento e, descobrimos então neste vasto universo, o mistério de Cristo.  Depois de apresentar ao seu Filho a situação dos noivos e de receber dele uma resposta – a de que ainda não havia chegado a sua “hora” – ela mesma, Maria, vai dizer aos funcionários: Fazei tudo o que Ele vos disser. Em todo o Evangelho essa parece ser a mais significativa frase da Virgem Maria. Ela nos projeta para o Cristo e nos faz olhar para Ele, ouvindo e guardando em nosso coração a Sua Palavra, como ela mesmo o fez de maneira perfeita.

Abre-se, então, a terceira parte da passagem: a realização do milagre. Jesus dá uma ordem à qual os serviçais obedecem prontamente. Eles enchem as talhas, seis, com 100 litros cada, e as levam ao mestre sala. Este, ao provar a água, percebe que se trata de um vinho melhor, muito melhor do que até então vinha sendo servido.

As últimas duas partes da passagem nos trazem respectivamente o diálogo entre o mestre sala e os noivos e a conclusão, que nos mostra que o início dos sinais de Jesus se deu ali, em Caná. A conclusão se reveste de uma particular importância porque ela nos revela que, a partir deste sinal, a “glória” de Jesus se manifestou e seus discípulos “creram” nele. O milagre serve, assim, para suscitar a fé.

Esta passagem resume para nós a história da salvação. O vinho primeiro pode ser entendido como a primeira aliança. Este era bom, mas ainda imperfeito, uma vez que a primeira aliança era sinal e prefiguração de uma aliança melhor, àquela que deveria se realizar em Cristo. O vinho novo, que causa a admiração do mestre-sala, é a Nova Aliança, a que Cristo nos traz, e que supera infinitamente a antiga. Aliás, convém lembrar que muitas vezes no Antigo Testamento o vinho, sinal de alegria e prosperidade (cf. Sl 104,15), aparece ligado ao festim escatológico (cf. Am 9,13; Is 25,6 etc), que aqui é inaugurado por Cristo nas Bodas de Caná.

Em se tratando da celebração da Eucaristia, contexto no qual este texto é lido hoje este evangelho, convém ressaltar a ligação desta imagem do vinho novo com a Eucaristia. A Eucaristia é antecipação do festim que será realizado nos céus. Ela é a renovação constante do banquete messiânico inaugurado por Cristo na última ceia e que é, de certa forma, prenunciado nesta passagem. O vinho novo da alegria é o Sangue de Cristo, dado a nós para que tenhamos vida em abundância.

A liturgia é não só memória e realização, mas também profecia. Celebramos o Mistério da Páscoa na expectativa da consumação dos tempos. Enquanto aguardamos este dia, vivendo no tempo da Igreja, cumpre-nos seguir aquilo o que a Palavra de Deus nos orienta a fim de que a vida cristã seja, de fato, cristã. Por isso, precisamos colher também uma lição da segunda leitura. Trata-se de um trecho do cap. 12 da 1 Coríntios, onde Paulo fala aos seus irmãos a respeito dos dons. Poderíamos ficar com dois versículos: os dons são diversos, mas um mesmo é o Espírito (cf. v. 4) e ainda “a casa um é dada a manifestação do Espírito para o bem comum” (cf. v. 7).

Não importa qual seja o dom com o qual tenhamos sido agraciados pelo Senhor, devemos ser sempre gratos, pois foi o único e mesmo Espírito do Senhor que nos agraciou com tal dom, chamando-nos a servir à Igreja por este meio. Importa, também, recordar, que os dons não são para nós, mas sim para o “bem comum”. Seja qual for o dom que recebemos de Deus Ele não é para nos enaltecer e, sim, para servirmos ao mesmo Deus por meio dos irmãos.

Que o Senhor nos ajude a viver assim, servindo sempre com humildade, obedecendo à voz do Cristo, como ordenou aos servos do Evangelho a Santa Virgem Maria!

Padre Fábio Siqueira
Autor

Padre Fábio Siqueira

Vice-diretor das Escolas de Fé e Catequese Mater Ecclesiae e Luz e Vida